Terça-feira, 14 de fevereiro de 2006
Ayahuasca, o "vinho dos mortos"
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Foto: Sérgio Polignano - C.E.B.U.D.V.
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Ayahuasca significa "liana dos sonhos" ou "vinho dos mortos" (em quéchua, língua indígena peruana, aya simboliza o espírito e o ancestral, e huasca, vinho ou chá) sendo uma bebida psicoativa feita através da fervura de duas plantas: o cipó jagube (mariri) e o arbusto chacrona (conhecida como rainha) onde estas são misturadas em um processo chamado "feitio", que pode levar várias horas ou dias. As outras denominações do ayahuasca são: caapi, yagé (yajé), vegetal, daime, vinho de Deus, vinho das almas, hoasca etc. A cor do chá varia entre o bege e o marrom mais escuro, e seu gosto é amargo. A primeira descrição da bebida ocorreu em 1855. Existem indícios arqueológicos de que os nativos a bebiam há 5 mil anos na América do Sul e há mais 2 mil anos no Brasil. O uso do ayahuasca é uma tradição de tribos do Brasil, Peru e Equador. As mais importantes seitas religiosas no Brasil que se utilizam do chá são o Santo Daime e a União do Vegetal (UDV). Outros grupos são: Cefluris, A Barquinha, Natureza Divina, Equipe Álcool e Drogas sem Distorção, Ecologia Cognitiva etc. A UDV é considerada a maior organização (seis mil seguidores no país). Nasceu em 1961 em Rondônia e seu fundador foi o mestre José Gabriel da Costa. O Santo Daime foi criado na década de 30 pelo seringueiro Irineu Serra. Ele tomou o chá pela primeira vez em 1913 quando teve contato com os caboclos em Basiléia (oeste acreano) que herdaram dos seus ancestrais o conhecimento sagrado do ayahuasca. Sob o efeito do chá, Irineu teve a visão de Nossa Senhora e sob inspiração divina, escreveu os ensinamentos e os hinários que fazem parte fundamental da doutrina. Um de seus mais importantes discípulos foi o seringueiro Sebastião Mota Melo, que fundou a vila Céu do Mapiá em 1983, a maior comunidade da doutrina religiosa do Santo Daime no Brasil com dois mil adeptos. No Brasil, o chá é considerado enteógeno, ou seja, seu uso é permitido por fazer parte de um ritual religioso em um contexto litúrgico específico. É importante informar que não causa dependência física. Na Europa, seu uso ainda não é permitido. Quem experimentou o chá explica que é possível "sentir o poder da floresta". Não ocorre uma simples alteração da consciência, mas uma nova maneira de obter um ensinamento de esferas espirituais. A ingestão do chá faz com que a pessoa limpe a alma e o corpo de toda a impureza, viajar no tempo, contatar seus antepassados e entrar em sintonia com o mundo divino. Até 2000, foram cadastrados no Brasil 20 grupos (ou igrejas) com autorização para tomar o chá. Ao tomar o ayahuasca ocorre: alteração de pensamento, memória mais aguçada, mudança no significado dos julgamentos, sensação de rejuvenescimento, sensação do espírito estar saindo do corpo e de viajar para outros lugares etc. Seus efeitos colaterais podem ser vômitos e diarréias. Em algumas pessoas, notou-se um aumento da pressão arterial e dos batimentos cardíacos, além da incoordenação motora. Depois de alguns minutos da ingestão pode ocorrer a sonolência. A dança e os hinos ajudam na concentração para chegar a miração (Daime) ou a burracheira (UDV). O efeito dura minutos ou horas. Os grupos tem princípios católicos e recebem visitantes de várias religiões e filosofias que buscam através do chá, uma autoconsciência. Além disso, os grupos não tem fins lucrativos. Não existe risco à saúde, mas quem sofre de síndrome do pânico ou quem usa anti-depressivo (que tenha a fluoxetina no seu principio ativo), além dos indivíduos com o transtorno bipolar ou esquizofrenia não devem ingerir o chá. No Brasil, o CONAD (Conselho Nacional Anti-Drogas) retirou em caráter definitivo a Ayahuasca da lista de drogas alucinógenas conforme portaria publicada no Diário Oficial da União em 10/11/2004. O que leva a pessoa a tomar o chá é comungá-lo ritualmente para obter uma aspiração de elevação espiritual, tratando-se portanto, de uma liberdade religiosa e um direito inalienável de toda pessoa de eleger uma prática religiosa que a ajude a obter uma compreensão espiritual sobre o planeta.
Monica Buonfiglio
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