Para Marieta Severo, assédio não é problema

Sábado, 21 de abril de 2001, 16h15

Marieta Severo deixou de lado as personagens ricas e chiques para viver uma suburbana em A Grande Família.Confira a entrevista de Marieta Severo.

Você sempre passou uma imagem de mulher elegante. Como é interpretar uma dona-de-casa, que usa short surrado e chinelo de dedo?

Para mim é uma surpresa fazer uma mulher da classe média brasileira. Ainda mais logo depois de interpretar a Alma, que era o oposto da Dona Nenê. A oportunidade de interpretar duas personagens diferentes é um grande laboratório. E nem foi difícil compor a Nenê. Eu fui criando o papel aos poucos, num trabalho de observação. Tive até de aprender a dançar funk, que é o estilo de música preferida dos filhos da minha personagem, interpretados por Lúcio Mauro Filho e Guta Stresser. Eu acho que o que dá mais trabalho é ter de chegar uma hora e meia antes da gravação para enrolar o cabelo.

Uma dona-de-casa como a Dona Nenê é uma exceção nos dias de hoje, pois as mulheres tiveram de trabalhar fora para ajudar no orçamento familiar. Mesmo assim, está havendo uma identificação do público com a personagem?

Descobri que, na verdade, existem muito mais "Nenês" do que a gente imagina. Até porque, muitas vezes, pela economia da família é mais lucrativo que a mulher fique em casa. Ela não tem condição de contratar uma empregada, de pagar alguém para ficar com os filhos e nem tem vocação especial. Então, colabora mais com a economia doméstica ficando em casa. Quando à aceitação, acho que todos os personagens foram bem, pois o nosso humor não usa o preconceito para arrancar riso, seja ele racial ou sexual. E até acredito que o telespectador tem o desejo de sair desse cinismo que as novelas mostram. A Grande Família busca outros valores. Por mais que o genro da Dona Nenê, papel de Pedro Cardoso, seja malandro, ele não vive em função do "vale tudo", do cinismo e do "cada um por si".

A primeira versão de A Grande Família, escrita por Oduvaldo Vianna Filho, foi exibida entre 1973 e 1975. Na época, o seriado foi marcante para você?

Nessa época eu fazia teatro de terça a domingo. Saía de casa às sete da manhã e voltava à meia-noite, então não assistia à tevê. Eu vi um episódio, por acaso, na Globo News. Era um programa que fazia homenagem ao Vianinha e deu para ver qual era a cara de A Grande Família.

Você chegou a trabalhar na comédia Se correr o Bicho Pega, também do Vianinha. Qual é a lembrança mais forte que guarda dele?

Naquela época eu era bem jovem e tinha a sensação que ele sempre estava querendo fazer a minha cabeça, achava que ele gostava de me orientar. Hoje tenho a consciência que o Vianinha queria me passar coisas boas e ele tinha prazer de conversar com aquela "fedelha". Eu também tinha curiosidade. Percebia que ele era muito inteligente e queria usufruir disso. Eu me orgulho de estar fazendo um remake baseado na obra do Vianinha. Esse foi um dos motivos pelo qual aceitei o papel.

Você está sempre envolvida com o humor. O da Alma era irônico e involuntário. O da Dona Nenê é mais proposital?
Eu acho que o humor da Nenê também é involuntário. Ela não tem a intenção de ser engraçada. A Nenê está vivendo a vida dela e a sua maneira de se relacionar com as situações se torna cômica. A Alma era mordaz, irônica. Com certeza eu me sinto mais à vontade fazendo humor. Eu trabalho com mais prazer e acho divertido.

Como está sendo a repercussão da Dona Nenê nas ruas?

A Alma foi uma personagem que me deixou extremamente popular. Ela teve uma grande aceitação do público. No Carnaval, eu fui para o meio da rua, em Salvador e dancei no meio da muvuca. As pessoas me abordavam para dar os parabéns, brincavam e até faziam piadinhas por causa do Danilo, personagem de Alexandre Borges. Com a Nenê está sendo parecido. Nós fizemos apenas quatro episódios e várias pessoas já vieram conversar comigo sobre o jeito da Nenê. O pessoal comenta muito a cena que ela dançou funk.

Você disse que foi pular Carnaval no meio da muvuca. Não tem medo desse assédio?

De jeito nenhum. Pelo contrário, eu acho que quem vive cercado de seguranças se priva de momentos absolutamente especiais. Quando estava no meio das pessoas em Salvador, eu senti realmente como a Alma era querida. Eles me tratavam com o maior carinho e bom humor. Então acho que é azar de quem perde esses momentos. É ali que o ator vê o resultado do seu trabalho.

Você tinha acabado de fazer Laços de Família. Além do fato de A Grande Família ser escrita por Vianinha, que outros motivos a levaram emendar um trabalho?
Achei que ia descansar depois de Laços de Família, já que novela é um trabalho que ocupa a cabeça da gente o tempo todo. Dificilmente tenho tempo para ler um livro ou fazer algo que gosto. E tinha a intenção de não fazer televisão por um bom tempo. Só que me veio um chamado do Guel Arraes, que é o diretor de núcleo do seriado. Ele corresponde, dentro da tevê, a tudo que admiro e tenho vontade de fazer. Eu me sinto em casa trabalhando com ele, pois sempre participei e fui muito ligada ao seu núcleo. Quando eu gosto do projeto, não consigo me livrar dele.

Como você se sente ao reeditar a parceria com o Nanini?
Definitivamente, já somos um casal na ficção. Começamos a parceria em meados dos anos 70 na comédia As Desgraças de Uma Criança, com direção de Antônio Pedro. Depois trabalhamos no A Comédia da Vida Privada, fomos casal no filme Carlota Joaquina, A Princesa do Brasil e na peça Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?. Entre nós há um carinho e um conhecimento natural, que adquirimos com o tempo. E isso é fundamental no trabalho. Essa intimidade facilita. Sem falar no prazer de estar ao lado de um amigo.

É difícil encontrar bons papéis para atrizes de sua idade?

Eu acho que os papéis também vão ter de acompanhar a sua idade, e você acaba se desinteressando pelos que não são da sua idade. Eu não tenho interesse por uma personagem jovem. Não me sinto perdendo, e sim, ganhando os papéis que são adequados à minha idade. Eu não poderia fazer a Nenê há 15 anos. Estar podendo fazer esse papel é um ganho. Então, por enquanto, eu considero lucro.

Nesses 35 anos de carreira, tem algum personagem que você gostaria de interpretar e não conseguiu?

Tem milhares, mas eu nunca planejo os meus personagens. Não tenho vontade de fazer um personagem arbitrariamente. Em determinado momento da minha vida, chega um papel para mim e eu me apaixono por ele. Mas, não tenho o desejo em nenhum em particular. Tem gente que fala "Quero fazer a Lady MacBeth, do Shakespeare". O papel é maravilhoso, mas não quer dizer que eu queira fazer. Prefiro os personagens que estou interpretando atualmente. Para mim, tudo é ligado ao momento, às motivações, algumas até misteriosas, que levam a um determinado trabalho.Veja também:
» Marieta comemora reconhecimento em A Grande Família

Flávia Kyrillos
TV Press

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