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Infoguerra Juiz do RS condena jornalista por envio de spam

Quarta, 26 de junho de 2002, 12h27

A primeira decisão da Justiça brasileira condenando a prática de spam (envio de e-mails sem a autorização expressa dos destinatários) foi proferida pelo juiz Martin Schulze, da 3ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública de Porto Alegre. Ele condenou o jornalista Diego Casagrande, que havia interposto duas ações contra a Procergs (Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul).

Casagrande é responsável por uma "newsletter" enviada para cerca de 11 mil pessoas diariamente. O boletim informativo, cuja distribuição deverá ser interrompida quando a decisão judicial for publicada nos próximos dias, chega aos destinatários utilizando-se do correio eletrônico do provedor Via-RS, controlado pela Procergs, empresa ligada ao governo do Estado.

Segundo a assessoria de imprensa da Procergs, em outubro do ano passado a empresa decidiu restringir o envio indiscriminado de e-mails, atendendo a reclamações de usuários do provedor contra o recebimento de mensagens indesejadas, tendo, antes da implementação da medida, notificado os clientes do Via-RS. Em novembro, Casagrande, inconformado com a iniciativa, obteve liminar que determinava à Procergs o restabelecimento do envio da sua "newsletter", o que foi feito.

Em sentença redigida no último dia 17, o juiz Schulze revogou a liminar e julgou improcedentes duas outras ações de Casagrande, que ainda foi condenado a pagar custas e honorários advocatícios no valor de R$ 400.

O juiz disse que "não foi ilegal, à luz do direito, a conduta de coibir a remessa do jornal eletrônico, porque o serviço por ele prestado não pode ser considerado de caráter público, eis que de interesse exclusivamente privado. Houve violação do dever contratual no caso concreto, pois a correspondência eletrônica constituía, à luz da definição do 'Movimento Anti-Spam', spam mail, pois eram enviadas indiscriminadamente 11.000 mensagens diariamente e não ficou provado que o agir da requerida (Procergs), ao cancelar o envio de mensagens, constituiu censura à atividade jornalística do autor (conforme Casagrande também alegara)".

No processo, o jornalista pedia que a Justiça declarasse que sua correspondência não se caracterizava como spam. O juiz disse que o pedido carecia de possibilidade jurídica, uma vez que ainda não há definição legal sobre o assunto no Brasil, ao contrário de países como Estados Unidos e França, por exemplo, onde a prática tem recebido condenações.

Ainda de acordo com a decisão da 3ª Vara da Fazenda Pública, Casagrande não conseguiu provar que tenha sofrido danos morais. O jornalista alegou que a Procergs havia qualificado seu informativo de "lixo eletrônico". "Só existe a alegação do autor (Casagrande), que não serve de prova", afirmou o juiz.

O Ministério Público, em seu parecer, disse que "os autos evidenciam que a correspondência eletrônica de Casagrande era enviada sem a anuência ou autorização dos destinatários, o que caracteriza, segundo a definição do Movimento Anti-Spam, spam mail". O promotor de Justiça Julio Cesar Finger acrescentou que "não condiz com a realidade" a afirmação de Casagrande de que sua "newsletter" só é enviada mediante solicitação e é interrompida mediante mensagem para o endereço descadastrar@opiniaolivre.com.br. "O autor (Casagrande) não fez essa prova", disse o representante do MP, lembrando que há nos autos reclamações de pessoas contra o recebimento da newsletter e contra o não-descadastramento, embora solicitado.

O editor de Internet e Tecnologia da Revista Consultor Jurídico, Omar Kaminski, considera que a sentença foi lúcida. "Como parece não ter havido prova do recebimento de solicitações de adesão ao 'newsletter', na prática o envio dos folhetins eletrônicos acabou sendo equiparado à prática de spam (envio sistemático de mensagens não-solicitadas). A propaganda não-solicitada só deixa de ser assim considerada quando há o cadastramento efetivo, explícito, que consiste no interesse concreto, na manifestação de interesse em receber as mensagens por meio de cadastramento, quer seja no site, por email, ou em formulários ou outros documentos impressos. Conforme noticiado nos autos, mesmo diante de um volume expressivo de reclamações, não estava havendo o descadastramento daqueles que se impuseram contra a prática."

Kaminski observa que o fato de constar um endereço de email para o descadastramento não tem o poder de tornar um spam válido ou legal, necessariamente. "Os spammers não costumam respeitar a privacidade dos internautas. Na maioria das vezes, colocam um email fictício, então a mensagem acaba retornando ao remetente, e isso só aumenta ainda mais o fluxo de lixo eletrônico na Rede. O volume de mensagens pedindo a retirada da lista pode ser tamanho que acaba excedendo a capacidade da caixa postal do spammer, congestionando servidores e backbones, e que também acabam retornando ao remetente.

"Outra forma de descadastramento obriga o usuário a entrar no site do spammer e digitar seu endereço eletrônico para sair da lista. Às vezes esse sistema não funciona, ou o site está fora do ar, ou o usuário sequer sabe o endereço que foi cadastrado (pois está oculto na mensagem), ou serve apenas para confirmar que o endereço é válido e está operacional. E tudo isso só aumenta a ira contra o spam. No mínimo, por nos obrigar, diariamente, a perder tempo 'baixando' e apagando emails que não queremos receber", conclui Kaminski.

O Judiciário gaúcho, como já ocorreu em decisões relacionadas a outras áreas do direito, adota uma posição de vanguarda com essa sentença anti-spam. E o assunto já está sendo tratado na Câmara dos Deputados, onde tramita um Projeto de Lei para regular a prática de spam.

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