Roberto Justus diz que não é candidato à Presidência, mas revela o que diria se fosse
"Gente, quero ficar quatro anos aí fazendo alguma coisa pelo meu país. Só acredito de um jeito: fazer direito. Sou obstinado por fazer direito. Então acredite em mim: não vai ter acordo, não vai ter conchavo, vou me dedicar a vocês por quatro anos da minha vida. E não quero oito anos, não quero me reeleger. Quero fazer o possível para o Brasil ser um player mundial." De terno e olhos azuis, Roberto Justus fala para a câmera.
Fora de contexto, as frases acima poderiam ser parte da propaganda eleitoral de Justus. Mas foram ditas por ele no meio de uma resposta sobre a importância da TV nas campanhas políticas. A câmera é a da reportagem e o fundo, seu escritório na zona oeste de São Paulo.
Em entrevista à BBC Brasil, o empresário, cotado desde o fim do ano passado para a corrida presidencial de 2018, diz que não participará das próximas eleições. No entanto, não deixa de comentar o que faria caso ocupasse a cadeira mais importante do país - ideia que não descarta por inteiro.
Um dos ex-apresentadores do reality show O Aprendiz, já comandado por João Doria e, nos Estados Unidos, Donald Trump, Justus é visto como um provável novo outsider na política. Ele conta que, depois das vitórias dos colegas, o empresariado começou a apostar na sua candidatura, o que logo chegou aos partidos políticos. Foi sondado por vários deles e até se reuniu com o grupo do presidente Michel Temer.
Em novembro, ao dizer a um jornal que admitia a possibilidade da candidatura, viu o debate se expandir.
"Virou uma pressão danada. Andava pelas ruas lá no Sul, onde fui passar o Réveillon (e as pessoas diziam): 'Presidente! Presidente!'. Foi impressionante como pegaram carona na ideia."
Para ele, o fato de ter interpretado um "patrão implacável" em O Aprendiz o tornou popular entre os brasileiros. Sobre a mesa de seu escritório, os dizeres de uma placa metálica resumem essa imagem: "I'm not bossy, I'm the BOSS", algo como "não sou mandão, sou o chefe".
"Apresentei um programa onde era um patrão duro, exigente, ético demais e isso criou no imaginário das pessoas uma coisa de: nossa, esse cara é competente."
Apesar da agitação em torno de seu nome, Justus afirma que não entrará na disputa do ano que vem. No fim de janeiro, ele publicou um artigo no jornal Folha de S.Paulo intitulado "Ser ou não ser" e explicou por que, embora estivesse lisonjeado com o apoio, decidiu não concorrer.
O principal motivo seria sua aversão às alianças necessárias para governar no país, onde diz que mandantes não têm autonomia. O mundo da política seria "muito sujo" e ele, "um 'sincericida'" que não se adaptaria ao jogo.
"Se quiser ser eleito, preciso entrar no partido majoritário, no PMDB, no PSDB. No PSDB nem tem lugar, no PMDB talvez tenha, mas você tem que fazer acordo, para ter 12, 13 partidos te apoiando. Já começa um acordo que não quero fazer com ninguém."
Justus diz que andou pensando muito nos últimos meses e se descobriu inapto ao poder como ele é hoje. O que diria, então, para quem esperava vê-lo no horário eleitoral?
"Diria que cheguei à conclusão (de) que dificilmente sobreviveria no mundo político. 'Ah, mas é isso que queremos'. Tudo bem, é isso que vocês querem, mas é inócuo, é me colocar dentro de um sistema do qual vou ser expelido."
'E se…'
Intercaladas com as negativas, Justus desenha aos poucos como seria seu governo caso fosse eleito. Sentado em seu escritório, com terno e camisa impecavelmente passados, recorre várias vezes ao modo subjuntivo "e se…".
Muitas dessas falas seguem comentários sobre o governo Temer, o qual elogia. Ele faz parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, junto a outros 95 integrantes. Para o publicitário, o presidente vai "entrar na história como aquele que colocou o Brasil nos trilhos, preparando o país para uma retomada".
O empresário considera que as reformas propostas, como a da Previdência, são necessárias e não levam à perda de direitos sociais, argumento usado com frequência pelos críticos do Planalto.
"Tem que ser muito cego para não ver que as decisões foram adequadas. Eu teria feito semelhante, qualquer gestor que entrasse lá. Talvez teria cortado mais a máquina pública, coisa que um político não faz, até por natureza."
Justus teria feito mais coisas de forma diferente. O publicitário diz que Temer errou ao não afastar ministros envolvidos em denúncias de corrupção, como o ex-titular da Secretaria de Governo, Geddel Viera de Lima. Após Marcelo Calero, que tinha acabado de deixar a pasta da Cultura, acusá-lo de pressão para liberar uma obra em Salvador, foi Geddel quem pediu demissão.
"(Temer) não é um gestor. Eu seria muito mais duro no lugar dele e teria tolerância zero com ministro que envolve interesses pessoais com interesses públicos. Tolerância zero com uma série de coisas que vejo o governo demorar um pouco para reagir."
A "tolerância zero" se estenderia ao Congresso. Pouco fã das alianças necessárias para conseguir o apoio dos parlamentares, ele diz que, se seus projetos não fossem aprovados na Casa, iria "ao povo".
"Vou à televisão dizer 'olha, seus deputados não aprovaram uma coisa que é muito importante para o nosso país'. Eu falaria na hora: 'quem não quis aprovar e quem não quer o futuro do Brasil conforme a gente imagina são nossos deputados, nossos senadores'."
Doria presidente, Trump fanfarrão
Se Justus se considera sem estômago para o jogo político, ele aponta quem, na sua opinião, aguenta bem as pressões: o prefeito de São Paulo, João Doria. Eleito com 53% dos votos válidos, depois de uma campanha que o identificou como trabalhador e ótimo gestor, Doria é para Justus "um grande exemplo".
"Ele tem uma paciência de ouro, engole todos os sapos que você quiser, e depois vai lá e faz do jeitinho dele. É um obstinado, um sujeito que trabalha das sete das manhã à uma da manhã. Olha o que esse cara fez em trinta dias."
Justus toma um copo de água, enquanto um pouco de suor se acumula debaixo de seus olhos. O ar condicionado não está funcionando. Continua falando do colega, em quem encorajou as ambições políticas. Para o empresário, Doria não vai parar na Prefeitura.
"João Doria quer ser presidente do Brasil um dia. Pode escrever! Ele fala que não, mas tenho certeza que ele quer. E a grande plataforma para elegê-lo presidente do Brasil vai ser fazer um trabalho memorável na maior cidade da América Latina.
O tom muda quando o assunto é Trump. Embora as críticas sejam feitas sem agressividade, o considera pouco preparado e "fanfarrão". Ao falar sobre o presidente americano, hesita ao negar um cenário em que estivesse no comando do país.
"O João é um cara muito mais coerente do que o Trump. Não tenho o menor receio de falar isso, espero que não seja presidente um dia, como não vou ser mais, porque fica chato diplomaticamente eu falar um negócio desse, mas o presidente, para mim, mesmo na campanha, deixava a desejar para caramba", afirma.
"(Ele) tem um estilo autocrático, quase ditatorial, egotrip total. Gastar dez bilhões de dólares para fazer um muro com o México? (É) inócuo, porque os caras vão achar outra forma de entrar nos Estados Unidos."
2018
A conversa está acabando. A assessora avisa que Justus está atrasado para gravar a nova temporada de Power Couple Brasil, reality show no qual casais disputam um prêmio de R$ 1 milhão.
O empresário é direto: mais duas perguntas.
Descarta completamente um futuro na política? "O amanhã pertence ao amanhã. Nunca falo dessa água não beberei, mas é uma decisão muito séria, de não levar adiante."
Se não estará em 2018, quem estará? Ele pensa um pouco.
"Não tenho ainda. Estamos carentes ainda de um bom nome, mas vamos esperar", diz, terminando a frase com um sorriso.
Tira o microfone e despede-se.