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Por que 19 sacerdotes e teólogos acusam o papa Francisco de heresia

Em carta aberta, grupo ultraconservador pede investigação do atual papado por 'ir contra mandamentos da igreja' em assuntos de cunho moral.

1 mai 2019 - 17h13
(atualizado às 17h30)
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Papa Francisco recebe bispos em foto deste 1º de maio; igreja vive polarização entre simpatizantes do papa e grupos ultraconservadores
Papa Francisco recebe bispos em foto deste 1º de maio; igreja vive polarização entre simpatizantes do papa e grupos ultraconservadores
Foto: EPA / BBC News Brasil

Um grupo de sacerdotes e teólogos escreveram uma carta aberta ao Colégio dos Bispos da Igreja Católica acusando o papa Francisco de "heresia" — uma das mais graves acusações que podem ser feitas a um clérigo.

Na carta, publicada na terça-feira (30/4) no site católico conservador LifeSiteNews, que comumente tece críticas ao papa, os 19 signatários alegam que o conjunto dos bispos católicos deve investigar Francisco pelo "delito canônico da heresia" e pregam que outros sacerdotes critiquem Francisco publicamente.

Trata-se de mais um sinal do crescente enfrentamento entre os tradicionalistas (ou ultraconservadores) católicos — insatisfeitos com declarações do papa em questões como sexualidade — e os apoiadores do atual papado.

Os motivos da "heresia", dizem os signatários, é que o papa teria suavizado posições que, na opinião deles, vão contra os mandamentos da igreja em diferentes assuntos: os acusadores afirmam que Francisco não tem se oposto veementemente o bastante ao aborto, tem dado sinais de abertura do Vaticano a homossexuais e divorciados, e tem se aproximado de protestantes e muçulmanos.

Em 2015, por exemplo, o papa organizou uma conferência no Vaticano na qual tentou relaxar as regras que impedem divorciados e pessoas em um segundo casamento de receber a Comunhão — uma vez que a igreja considera o casamento indissolúvel e o novo casamento, um adultério.

Eles também citam casos em que o papa teria protegido ou sido conivente com cardeais e bispos que, segundo a carta, estariam protegendo abusadores sexuais ou até cometido abusos.

Uma parte significativa da carta se concentra em críticas a um documento papal do ano seguinte, o Amoris Laetitia (A Alegria do Amor, em tradução livre), em que Francisco fala em tornar a igreja mais inclusiva e menos disposta a julgamento de seus 1,3 bilhão de fiéis.

No documento, o papa pede uma igreja menos rígida e mais cheia de compaixão diante qualquer membro "imperfeito", como os divorciados e os em segundos casamentos civis.

Papa durante missa em Abu Dhabi em fevereiro, quando assinou comunicado conjunto que despertou crítica de conservadores
Papa durante missa em Abu Dhabi em fevereiro, quando assinou comunicado conjunto que despertou crítica de conservadores
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Debates morais

Após a publicação do Amoris Laetitia, grupos conservadores acusaram o papa de criar confusão em torno de questões morais importantes, diz a agência Reuters.

Nas 20 páginas da carta desta terça-feira, os signatários dizem que tomaram "esta medida (carta aberta) como um último recurso para responder ao acúmulo de danos causado pelas palavras e atos do papa Francisco ao longo de diversos anos, dando abertura para uma das maiores crises na história da Igreja Católica".

O documento também critica o papa por ter dito que as intenções de Martinho Lutero (pai da Reforma Protestante, momento de ruptura do cristianismo) "não eram equivocadas" e por Francisco ter assinado um comunicado conjunto com luteranos no qual mencionava os "presentes teológicos" da Reforma.

Também foi criticado o comunicado conjunto que o papa assinou em fevereiro com um líder muçulmano em Abu Dhabi, dizendo que o pluralismo e a diversidade de religiões era um "desejo de Deus", o que irritou conservadores católicos.

O signatário mais conhecido entre os 19 que divulgaram a carta é o padre britânico Aidan Nichols, 70, da ordem dominicana, autor de diversos livros e teólogo proeminente.

Consultado pela agência Reuters, o Vaticano não se pronunciou sobre a carta até a publicação desta reportagem.

Quase medieval

A acusação de heresia soa quase medieval e raramente é usada na Igreja Católica moderna, informa o repórter da BBC John McManus. Ainda assim, é uma acusação séria, especialmente quando tecida à cúpula da organização.

Cabe a um departamento específico do Vaticano, a Congregação para a Doutrina da Fé, a tarefa de "julgar os delitos contra a fé e os delitos mais graves cometidos tanto contra a moral como na celebração dos Sacramentos". O grupo é composto por seis cardeais e deriva da Santa Inquisição, estabelecida em 1542.

O professor de Teologia Massimo Faggioli, da Universidade Villanova (EUA), diz à Reuters que a carta é o exemplo da extrema polarização que afeta a igreja atualmente, a despeito da grande popularidade do papa mundialmente.

Ele avalia, porém, que a carta traz "poucas críticas legítimas e construtivas do pontificado e de sua teologia" para embasar uma acusação de heresia até o momento.

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