Por que o terremoto na Síria e Turquia foi tão devastador?
Terremoto provavelmente será um dos mais mortais desta década, segundo especialistas
O terremoto que deixou um enorme rastro de destruição na Turquia e Síria nesta segunda-feira, 6, provavelmente será um dos mais mortais desta década, segundo especialistas. O número de mortos nos dois países já passa de 5 mil e, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), pode ultrapassar 20 mil nos próximos dias.
Socorristas continuam buscando soterrados nos escombros, mas as chances de encontrar sobreviventes diminuem a cada hora. Em seus esforços, eles precisam enfrentar baixas temperaturas e muita neve em alguns locais.
Para especialistas, a dimensão da tragédia pode ser explicada por uma combinação de fatores, como horário do tremor, magnitude, localização e estrutura precária de edifícios construídos na região.
Intensidade do terremoto
O tremor atingiu uma magnitude de 7,8, sendo o terremoto mais forte registrado na Turquia desde 1939. Apenas três terremotos com magnitude maior do que 6 foram registrados na área desde 1970, segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS).
Em agosto de 1822, um abalo de magnitude 7 deixou cerca de 20 mil mortos na região. Esse terremoto foi tão forte, que provocou tremores secundários até junho do ano seguinte.
O mais recente tremor liberou 250 vezes mais energia do que o terremoto de 6,2 que atingiu o centro da Itália em 2016 e deixou cerca de 300 mortos, segundo Joanna Faure, diretora do Instituto para Risco e Redução de Desastres do University College London (UCL).
Em média, há menos de 20 tremores com magnitude acima de 7 por ano no mundo. Entre 2013 e 2022, apenas dois dos terremotos mais mortais do período foram da mesma magnitude que o desta segunda.
O epicentro ocorreu a uma profundidade de 18 quilômetros - que é relativamente rasa - na Falha Oriental da Anatólia, localizada ao longo do limite leste da placa tectônica de mesmo nome. Segundo especialistas, quanto mais próximo da superfície for o abalo, mais severo ele é em comparação a um da mesma magnitude ocorrido a profundidades maiores.
Horário e localização
O epicentro se localizou próximo à capital da província de Gaziantep, um importante centro industrial no sudeste da Turquia. O terremoto irradiou para o nordeste, trazendo devastação para o centro da Turquia e norte da Síria - uma região bastante populosa.
Das mais de 20 milhões de pessoas que a OMS estima que podem ter sido afetadas pelo terremoto, cerca de 5 milhões estariam em situação de vulnerabilidade. Somente na Turquia, 13,5 milhões de habitantes vivem na região atingida pelo abalo sísmico.
Além disso, o tremor ocorreu às 4h17 (horário local), o que significa que as pessoas estavam dormindo e "ficaram presas quando suas casas desabaram", afirma Roger Musson, pesquisador do Serviço Geológico Britânico.
Outro fator que diminui as chances de sobrevivência é o clima frio do inverno, acrescenta.
Qualidade das construções
O especialista britânico pontua ainda que os edifícios construídos na região não são adequados para uma área suscetível a grandes terremotos. Isso pode se dever em parte ao fato de que a falha tectônica onde o terremoto ocorreu se manteve relativamente estável nos últimos tempos, aponta.
A Turquia está situada numa das zonas sísmicas mais ativas do mundo. Em 1999, um terremoto na Falha Setentrional da Anatólia deixou mais de 17 mil mortos. No entanto, o tremor desta segunda-feira ocorreu do outro lado do país.
A Falha Oriental da Anatólia não registrou um terremoto de magnitude 7 por mais de dois séculos, o que pode significar que pode ter havido uma "negligência em relação ao quão perigosa" ela é, afirma Musson.
A vulcanologista Carmen Solana, da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido, ressalta que edifícios resistentes a tremores são fundamentais em regiões suscetíveis a terremotos. "A infraestrutura resistente é infelizmente desigual no sul da Turquia e particularmente na Síria", acrescenta.
Em resposta ao terremoto de 1999, o governo turco aprovou uma lei em 2004 que exige padrões modernos à prova de terremotos em todas as novas construções do país. Faure, do University College London, afirmou que Ancara precisa controlar se a legislação está sendo cumprida e verificar a possibilidade de melhorar a segurança de prédios mais antigos.
Tragédia se soma à guerra
Em relação à Síria, o vulcanologista Bill McGuire, da UCL, lembra que muitas estruturas de construções na região já estavam abaladas devido à guerra civil que assola o país há 12 anos.
As províncias sírias mais atingidas foram Hama, Aleppo e Latakia. A zona devastada se divide entre o território controlado pelo regime de Damasco e o último enclave nas mãos da oposição, que está cercado por forças do governo, apoiadas pela Rússia.
Os impactos do terremoto se somam à crise humanitária provocada pela guerra, com o país enfrentando graves problemas econômicos e um surto de cólera.
cn/lf (Reuters, AFP)