Carros elétricos pequenos eram o futuro — então por que ruas estão lotadas de SUVs?

As vendas de veículos elétricos têm diminuído nos principais mercados do mundo. Ao mesmo tempo, cresce a venda de SUVs - um modelo que, em geral, queima 20% mais combustível do que os carros hatches.

30 mar 2025 - 15h50
(atualizado às 17h06)
Novos veículos SUV cruzam a ponte para sair do Canadá em direção aos Estados Unidos
Novos veículos SUV cruzam a ponte para sair do Canadá em direção aos Estados Unidos
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Atualmente, cada vez mais veículos utilitários esportivos (SUVs, na sigla em inglês) podem ser encontrados nas ruas e fora delas, em várias partes do mundo.

Esta visão contraria as previsões das Nações Unidas (ONU) sobre uma inevitável virada rumo a veículos menores e mais ecológicos, devido à urgência da crise climática e ao aumento do custo de vida.

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É uma mudança que, até agora, não se materializou: 54% dos carros vendidos em 2024 em todo o planeta eram SUVs, incluindo os modelos a gasolina, a diesel, híbridos e elétricos.

Este índice representa um aumento de três pontos percentuais em relação ao ano anterior e cinco pontos percentuais sobre 2022, segundo o portal GlobalData.

Dentre os SUVs que estão agora nas ruas, incluindo modelos novos e mais antigos, 95% queimam combustíveis fósseis, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE). Mas os fabricantes afirmam que suas novas frotas deste tipo de automóvel estão se tornando cada vez mais elétricas - e que nem todos os SUVs vendidos atualmente causam aumento das emissões de carbono.

Moradores de Paris votaram a favor do aumento das tarifas de estacionamento para os SUVs na capital francesa. O objetivo era reduzir as emissões de carbono e aumentar a segurança dos pedestres
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Os SUVs chamam a nossa atenção. Eles são maiores e pesados, seu interior é espaçoso, sua altura em relação ao solo é maior e sua posição de direção é alta, oferecendo melhor visão das ruas e estradas. Mas também existem versões menores no mercado.

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Entidades ambientais como o Greenpeace consideram que os SUVs são um dos vilões da crise climática. Eles defendem que sua fabricação consome recursos significativos, devido ao tamanho dos veículos.

Especialistas também afirmam que os SUVs exigem baterias maiores para alimentar suas versões elétricas. Estas baterias, por sua vez, aumentam a demanda por minérios críticos, pressionando ainda mais os recursos do planeta.

Acreditava-se que o momento fosse favorável para os veículos elétricos menores, com uso eficiente de energia. Mas as vendas de veículos elétricos (VEs) de tamanho padrão, na verdade, diminuíram nos principais mercados, como o Japão e a Alemanha, e suas vendas vêm crescendo menos na Índia.

Na Europa, as vendas de SUVs ultrapassaram as de VEs, apesar das indicações de uma tendência no sentido oposto apresentadas mais de meia década atrás.

Em 2018, foram vendidos na Europa 3,27 milhões de pequenos carros hatchback, incluindo os movidos a combustíveis fósseis e os elétricos. E, em 2024, foram 2,13 milhões, segundo o portal GlobalData.

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O gerente de previsões de vendas do portal, Sammy Chan, declarou que "isso ocorre, em parte, porque são oferecidas alternativas de SUVs em tamanhos menores, cujas vendas na Europa cresceram de 1,5 milhão em 2018 para cerca de 2,5 milhões, em 2024."

A China registrou o maior volume de vendas, com cerca de 11,6 milhões de SUVs em 2024, seguida pelos Estados Unidos, Índia e Alemanha, segundo o GlobalData.

O porquê do crescimento

Especialistas do setor afirmam que o poder de compra das pessoas vem aumentando em muitas economias emergentes. Com isso, os SUVs se tornaram a opção mais provável de compra.

"Os fabricantes reagem à demanda dos consumidores e os motoristas são cada vez mais atraídos pelos veículos com duplo propósito, considerando sua praticidade, conforto e boa visão da estrada", declarou o executivo-chefe da Sociedade de Fabricantes e Vendedores de Motores do Reino Unido (SMMT, na sigla em inglês), Mike Hawes.

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Analistas da indústria automobilística também afirmam que as altas margens de lucro oferecidas pelos SUVs atraem os fabricantes. Eles podem ganhar mais dinheiro com os SUVs, fabricando menos veículos.

"A indústria foi quem dirigiu a demanda com imensas campanhas de marketing e publicidade nos últimos anos", afirma o gerente de comunicação do Conselho Europeu de Segurança no Transporte, Dudley Curtis. "Os SUVs ofereceram à indústria uma forma simples de cobrar mais por um veículo que faz a mesma coisa [que os outros]."

O aumento previsto da popularidade dos veículos elétricos plug-in nos últimos cinco anos parece não ter se materializado
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Os SUVs são um problema?

Devido ao forte crescimento das vendas de SUVs, a AIE afirma que o consumo de combustível global desses veículos aumentou em 600 mil barris de petróleo por dia entre 2022 e 2023. Ele representa mais de 25% do aumento anual total da demanda global de petróleo.

"Se avaliarmos em comparação com os países, a frota global de SUVs seria o quinto maior emissor de CO2 do mundo, ultrapassando as emissões do Japão e de várias outras economias importantes", afirma o criador de modelos de energia da AIE, Apostolos Petropoulos.

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A agência destaca que, em comparação com os carros de tamanho médio movidos a gasolina e diesel, os SUVs queimam 20% mais combustível, pois o seu peso, em média, é 300 kg maior.

O transporte rodoviário é responsável por mais de 12% das emissões globais de carbono, que são a principal causa do aquecimento global. Os cientistas alertam que todos os setores precisam ser rapidamente descarbonizados, se quisermos evitar uma catástrofe climática.

Mas os representantes do setor se defendem, alegando que nem todos os SUVs sendo vendidos atualmente causam aumento das emissões.

"Cerca de dois a cada cinco desses [novos] modelos de veículos têm emissão zero, pois seu tipo de carroceria é bem adequado para a eletrificação. Sua maior capacidade de bateria pode tranquilizar os consumidores preocupados com a acessibilidade do carregamento", segundo Hawes, do SMMT.

"Isso fez com que as emissões médias de CO2 dos carros novos com duplo propósito caíssem em mais da metade desde 2000, o que ajudou o segmento a liderar a descarbonização da mobilidade rodoviária no Reino Unido."

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A ampla maioria dos novos SUVs ainda queima combustíveis fósseis, mas as autoridades da AIE declararam que mais de 20% dos SUVs vendidos em 2023 eram totalmente elétricos. Este índice era de 2% em 2018.

Em relação aos veículos híbridos, que podem ser alimentados por eletricidade e combustíveis fósseis, um estudo do Conselho Internacional sobre Transporte Limpo realizado na Europa em 2022 concluiu que, em média, apenas cerca de 30% da distância total percorrida por veículos elétricos híbridos plug-in (de todos os tipos, incluindo os SUVs) fez uso do modo elétrico.

Resultados similares foram encontrados em outras economias importantes, como os Estados Unidos e a China.

Os especialistas afirmam que, de forma geral, o retrocesso em direção aos SUVs atrasou significativamente a descarbonização do setor de transporte.

"A tendência de adoção de veículos mais pesados e menos eficientes, como os SUVs (verificada em alguns países), anulou grande parte das reduções de consumo de energia e emissões atingidas em outros países, em relação à frota global de carros de passageiros", declarou a AIE.

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No Reino Unido, o comitê de mudanças climáticas do Parlamento chegou a conclusões similares, no seu relatório de 2024 sobre a descarbonização do país.

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