Em 1975, um filme de Steven Spielbeg levou tubarões aos pesadelos de crianças, jovens e adultos em todo o mundo. Desde então, ataques fatais, como o que vitimou a estudante Bruna Silva Gobbi, no fim de julho, em Recife, trazem à tona esse pavor. Mas a história não é bem assim. “Não há motivo para ter medo de tubarão”, afirma o biólogo marinho Marcelo Szpilman, autor do livro Tubarões no Brasil (2004) e diretor do Instituto Ecológico Aqualung, entidade que defende a preservação do meio ambiente marinho.
Em contraste com filmes de Hollywood, os tubarões não são caçadores de seres humanos. De acordo com Szpilman, 90% dos ataques são acidente. Eles ocorrem, normalmente, em pontos de água turva, onde a visibilidade do animal é prejudicada, e a identificação do ser humano, também.
No Brasil, o problema é bem localizado, indica o biólogo marinho. Nos últimos 200 anos, houve apenas oito casos no Rio de Janeiro e nove casos em São Paulo. A grande concentração de ataques se encontra em uma faixa de 20 quilômetros em Recife, já bem delineada e monitorada. Foram 59 banhistas ou surfistas atacados pelos animais em Pernambuco desde 1992, segundo o Comitê Estadual de Monitoramento aos Incidentes com Tubarões (Cemit). Desse total, 24 faleceram.
As estatísticas não deveriam alarmar os banhistas, acredita o pesquisador. Por isso, ele compara os números de ataques de tubarões com aqueles promovidos por animais domésticos. “Em todo o mundo, são 90 a 100 casos de ataques de tubarão registrados por ano”, aponta. Já os cães são responsáveis por milhares de internações hospitalares todo mês. Embora não existam dados oficiais, estima-se que mais de 30 pessoas morrem todo ano por ataques de cachorro somente nos Estados Unidos.
Assim como os outros animais marinhos mais bem vistos pelos humanos, o tubarão cumpre uma importante função no ecossistema. “Mas ninguém precisa lembrar a importância de um golfinho, por exemplo”, diz Szpilman. “Temos que desmitificar o tubarão”.
As espécies mais conhecidas de tubarão estão no topo da cadeia alimentar subaquática. Esses predadores mantêm o controle populacional das suas presas habituais e são um instrumento da seleção natural, ao eliminar os menos aptos. Como se alimentam também de peixes doentes, feridos e mortos, colaboram para a manutenção da salubridade dos oceanos.
Os seres humanos não fazem parte da dieta dos tubarões. Sua alimentação varia conforme a espécie. O tubarão-baleia, por exemplo, o maior de todos, se alimenta apenas de plâncton e pequenos peixes. No cardápio tradicional dos tubarões, também constam lulas, crustáceos, focas, entre outros.
Em Recife
As praias de Boa Viagem, com 24 ataques, e Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, com 17, são recordistas de ocorrências. A orientação é de que os frequentadores evitem banho em áreas de mar aberto, durante a maré alta e em áreas profundas, com água acima da cintura.
A construção do porto de Suape, ao sul do Recife, é apontada como um dos principais fatores para a proliferação dos ataques na região, a partir do início da década de 1990. O processo levou à destruição dos mangues, que provocou a migração de fêmeas de tubarão-cabeça-chata, e o aumento de tráfego marítimo, o qual atrai os tubarões. Outros fatores apontados pelo Cemit são a pesca de arrasto de camarão, com descarte de peixes próximo às praias da área afetada e a topografia submarina da região, caracterizada por um canal profundo adjacente à praia.