A partir desta terça até domingo, a cidade de Rio Branco (AC) sedia um dos maiores fóruns para a difusão dos avanços da ciência e para debates de políticas públicas do País, a 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Às vésperas do evento, que ocorre desde 1948, a presidente da entidade, Helena Nader, conversou com a Agência Brasil.
Para ela, a participação de indígenas e extrativistas nesta edição do encontro será fundamental. Depois de 14 anos de espera, a comunidade científica vê avançar no Congresso um projeto de lei que trata do acesso à biodiversidade. O projeto foi encaminhado pelo Executivo no fim de junho e deve tramitar em regime de urgência. “O momento é ideal, porque essa legislação influencia diretamente a esses dois grupos”, defende a presidenta a SBPC.
Durante a entrevista, ela citou a falta de financiamento como o principal entrave da ciência brasileira nos dias atuais. “Enquanto nós investimos 1,1% do PIB (Produto Interno Bruto), a China investe mais de 3%”, afirmou a cientista. “Se não tiver recursos, o Brasil não vai dar o salto”, disse a presidente da SBPC.
Helena Nader ressaltou os preparativos para levar a reunião ao extremo oeste do País. Os voos estão esgotados, assim como as reservas nos hotéis. No entanto, até a semana passada, o encontro tinha menos inscritos que edições de anos anteriores. Até o momento, são 4,5 mil inscritos contra 22,9 mil no ano passado, em Recife (PE), e 11,9 mil, em São Luís (MA), em 2012. O número ainda pode crescer. A expectativa dos organizadores é reunir de 10 a 12 mil pesquisadores.
Leia a entrevista de Helena Nader:
Agência Brasil: Quais são as novidades da 66ª Reunião da SBPC e qual será a importância da participação de indígenas e extrativistas?
Helena Nader: Este ano, teremos o Dia da Família na Ciência [ou SBPC Família]. Queremos trazer a família para dentro da SBPC, com atividades voltadas para esse público. Queremos desmistificar a ciência, mostrando para todos que ela está presente no dia a dia. Teremos palestras, atividades lúdicas, isso é uma novidade. A SBPC Indígena ocorre já há dois anos. A gente tem trazido as populações tradicionais para mais perto da comunidade científica com mais frequência. Nesta edição isso será especialmente importante porque recentemente, depois de 14 anos, o projeto de lei de acesso à biodiversidade foi encaminhado ao Congresso. Infelizmente, com um rótulo de regime de urgência. A gente espera que isso seja retirado. O projeto é bom, traz avanços, mas tem que ser melhor discutido. O momento é ideal para ter essas duas reuniões (SBPC Indígena e SBPC Extrativista), porque essa legislação influencia diretamente esses dois grupos.
Agência Brasil: Por que a escolha do Acre? Como estão os preparativos?
Helena Nader: São os Estados e as universidades que se candidatam, o Acre pediu para sediar o que chamou de a maior das Copas, a da educação e da ciência. A organização está fantástica. As pessoas da cidade estão muito envolvidas. Infelizmente, não tem mais pessoas vindo porque estourou o número de acomodações, embora muita gente esteja sendo acomodada em casas de estudantes e em casas de família. A enchente do Rio Madeira bloqueou o acesso a Rio Branco, que depende de uma balsa. Há hotéis novos que estão prontos, mas faltam algumas etapas. Há móveis que não conseguiram chegar. Mas isso não impede de fazermos uma grande reunião. Vamos ver a importância da Amazônia. O Estado do Acre foi o que menos desmatou, mas nos últimos anos, 2012 e 2013, no Brasil, o desmatamento que vinha caindo, cresceu. Isso é um sinal vermelho. Vai precisar ter o desmatamento em alguns lugares, isso é óbvio, porque tem que dar condições de vida para a população, mas tem que fazer isso com equilíbrio.
Agência Brasil: Na pauta da ciência e tecnologia, qual o maior desafio atual?
Helena Nader: Os principais desafios continuam sendo o financiamento e um fluxo constante de financiamento. O Brasil melhorou, mas ainda está muito aquém do que precisa para dar aquele salto. Continuamos na 13ª posição em termos de publicação em periódicos indexados (registrados e avaliados). Nosso impacto, em termos de publicações, tem aumentado, mas ainda está aquém do que o Brasil pode fazer. Enquanto nós investimos 1,1% do PIB (Produto Interno Bruto), a China investe mais de 3%. Para que façamos nosso gol, precisaríamos chegar a 2%. Por isso, lutei tanto pelos royalties do petróleo [que foram destinados para saúde e educação]. Vou continuar lutando pelo Fundo Social [do pré-sal], 50% vai para educação e saúde. Ainda tem mais 50%, vamos tentar por 10% em ciência. Se não tiver recursos, o Brasil não vai dar o salto. O setor empresarial também tem que investir mais. O governo é o que mais investe. O investimento, em muitos lugares, está meio a meio, mas há lugares onde o governo investe 100% e o setor empresarial, zero.