Se o mundo já se dividiu uma vez por causa da cor de um vestido, está prestes a se fragmentar de vez por causa de um arquivo de áudio.
Assim como parte das pessoas via um vestido azul e parte das pessoas via um vestido dourado no mistério que viralizou há três anos nas redes sociais, agora, parte das pessoas que ouve um som robotizado circulando nas redes diz ter ouvido a palavra "Laurel"; a outra parte conta ter escutado "Yanny".
Para se ter uma ideia dessa divisão, depois que um vídeo com o áudio migrou para o Twitter, em questão de 24 horas (em contagem observada na quarta-feira, dia 16), "Yanny" foi escolhido 310 mil vezes, e "Laurel", 330 mil.
Não se preocupe, ninguém está ficando louco. Há algumas explicações para isso.
O nosso ouvido escuta uma leque bem grande de frequências, das mais baixas às mais altas. Normalmente, o nosso cérebro aglutina essas frequências para interpretar os sons. Ou seja, não tem a ver com o ouvido, mas sim com o cérebro, e como ele processa os sons.
No caso dessa gravação, se nosso cérebro embarcar na frequência mais alta, a chance de escutar "Yanny" é maior. Se embarcar na mais baixa, "Laurel" sai ganhando. Mas o que faz o cérebro escolher um ou outro caminho?
Para o professor Adrian Rees, professor de neurociência auditiva da Universidade de Newcastle, na Inglaterra, o mistério do áudio é equivalente a ilusões de ótica como aquelas em que as pessoas veem duas imagens distintas em uma mesma imagem. "Quando o cérebro recebe informações ambíguas, ele tem que escolher uma informação única para processar", afirma ele, que pertence ao time do "Yanny".
Segundo Will Sedley, professor do Instituto de Neurociência também da Universidade de Newcastle que diz escutar "Laurel", há três explicações possíveis para o fenômeno do áudio:
1) Acaso, simplesmente
Quando o cérebro recebe informações ambíguas, ele precisa escolher processar só uma dessas informações.
Embora não pareça, "Yanny" e "Laurel" são palavras muito parecidas, avalia Sedley, mesmo com consoantes distintas. "A estrutura silábica e a energia que usamos para dizer as duas palavras são semelhantes", afirma. Experimente fazer o som de "Ya" e "La" ou dizer as palavras pausadamente, separando as sílabas. Viu como seguem um padrão acústico, com estrutura parecida?
Assim, escutar uma outra palavra pode ser resultado do acaso. Mas quando o cérebro toma a decisão de seguir um caminho, ele o mantém - segue com essa decisão. Ou seja, se ele escolheu escutar "Laurel", provavelmente vai continuar escutando "Laurel", a não ser que você faça o experimento citado no item 3 (abaixo).
2) Familiaridade ou expectativa
Tudo tem a ver com como a informação acústica é processada no cérebro, algo que também depende das nossas experiências prévias. "Laurel", por exemplo, é um nome em inglês. Se você já ouviu esse nome ou já tinha familiaridade com ele, é mais fácil ouvi-lo na gravação, sugere o professor.
A expectativa também tem seu papel. Por exemplo, se alguém te passa o áudio e diz: "Olha como estão dizendo 'Yanny'!", é mais provável que você entenda "Yanny".
3) Plataforma
Não se preocupe: escutar "Laurel" ou "Yanny" não diz nada necessariamente sobre suas capacidades auditivas. E não tem nada a ver com idade, segundo o professor Rees. Sim, é verdade que com a idade a sensibilidade auditiva diminui. Mas o alcance das frequências desse áudio em particular não é particularmente alta para que alguém não as escute, diz ele.
E é possível fazer um experimento: dando maior potência à frequência grave, é mais provável que, se você escutasse "Yanny", passe a escutar Laurel. E ao contrário. Se potencializamos os agudos, você pode escutar "Yanny", se antes escutava "Laurel".
Por isso, o meio pelo qual se escuta o áudio pode influenciar o caminho que seu cérebro escolhe seguir. Escutar o áudio com fones de ouvido que priorizem uma frequência ou outra pode fazê-lo ouvir "Yanny" ou "Laurel".
Esse experimento também provoca um curioso fenômeno: depois de brincar com as frequências e ouvir uma palavra distinta da que tinha ouvido inicialmente, o cérebro tem a habilidade de aprender e adotar o novo padrão. Ou seja, se você começou ouvindo "Laurel", pode terminar ouvindo "Yanny". E vice-versa.