Pesquisadores brasileiros realizaram a descoberta de um conjunto de mais 57 fósseis de uma espécie de pterossauro (répteis voadores pré-históricos) que viveu há 80 milhões de anos na região de Cruzeiro do Oeste, no Paraná.
O estudo foi feito por uma equipe de cientistas do Centro de Paleontologia (Cenpaleo) da Universidade do Contestado (SC) e do Museu Nacional da Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ) e rendeu um artigo publicado na revista americana Public Library of Science (PLOS). Esse também é o primeiro registro de pterossauros encontrados na Bacia Sedimentar do Paraná, e uma das raras ocorrências mundiais de pterossauros no interior de continentes. No Brasil, eram até então conhecidas somente para a Chapada do Araripe, no nordeste brasileiro.
A nova espécie de pterossauro recebeu o nome de Caiuajara Dobruskii. O pesquisador do Cenpaleo Paulo Manzig explica que a escolha do nome foi primeiramente um referência à pedra da região, mas também uma homenagem. "Escolhemos o Dobruskii, que era o sobrenome da família de desbravadores da região e que na década de 70 fizeram a descoberta de alguns ossos, mas infelizmente na época não foi possível identificá-los e o exemplar ficou arquivado na Universidade Estadual de Ponta Grossa", revela.
E que em 1971 fósseis foram descobertos por dois homens do campo, Alexandre Gustavo Dobruski e seu filho, João Gustavo Dobruski, ao escavarem valetas para escoamento das águas em uma estrada rural. Em 1975, sabedores de que se tratavam de fósseis e percebendo sua importância para a ciência, enviaram amostras para análise. Somente em 2011, com os trabalhos de pesquisa para a elaboração do livro Museus & Fósseis da Região Sul do Brasil, esse material foi redescoberto em Ponta Grossa (PR) e identificado como pterossauro pelo pesquisador Paulo César Manzig. A partir daí, desenrolou-se um dos maiores feitos da história da paleontologia brasileira.
Os fósseis ocorrem no leito de uma antiga estrada do interior na cidade e nos barrancos laterais a esta, em uma área de aproximadamente 400m², onde apenas 20m² foram até então escavados. Os fósseis estão inseridos em camadas de arenito com aproximadamente 1,5m de espessura, que representa parte de um antigo deserto que cobria boa parte da região sul e sudeste entre 87 a 75 milhões de anos atrás, num período denominado Cretáceo. Para o pesquisador e coordenador destas pesquisas, o geólogo Dr. Luiz Carlos Weinschütz, “estes animais habitavam raras regiões úmidas entre dunas, como oásis, onde viviam e morriam no seu entorno. Esporadicamente, chuvas tempestuosas assolavam o local e carregavam ossos e sedimentos para o fundo destes lagos de forma caótica, contribuindo para a desarticulação dos esqueletos, o que torna o trabalho de coleta e identificação um imenso quebra-cabeça”.
A importância dessa descoberta é muito inusitada, pela própria região que, de acordo com Manzig, não era tida como portadora de fósseis, mas também pela incrível quantidade encontrada. "A região não era considerada fossilizada e houve a quebra desse paradigma para a geologia em si. Mas a importante concentração de material fóssil abre uma janela de investigação sem precedentes para refinar o conhecimento que se tem sobre esse novo pterossauro", ressalta.
Por se tratar de uma população desses animais, Manzig acredita que será possível, através dessa descoberta, dar inicio a uma série de estudos importantes para a paleontologia. "Poderemos aprimorar o conhecimento que se busca desses animais. Um pequeno osso já revela muita coisa, agora temos a incidência super rara de centenas de ossos de uma mesma espécie", afirma.
Primeiramente foram encontrados 47 ossos, depois mais 10. Para o pesquisador, existe a probabilidade de serem encontrados ainda muito mais na região. "Nós vamos poder trabalhar não só com conjecturas, mas afirmar com mais precisão o comportamento desses animais", avalia.
As escavações continuam sendo realizadas pela equipe do Cenpáleo em conjunto com a colaboração da prefeitura de Cruzeiro do Oeste, do Museu Nacional e da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa (FAPERJ).
Alexandre Kellner, pesquisador do Museu Nacional que faz parte da equipe, acredita que a região deve abrigar mais de cem se não mais ossos dessa espécie. "Com a quantidade já encontrada, foi possível a elaboração desse primeiro estudo, mas importantes descobertas ainda serão feitas porque poderemos detalhar todo o esqueleto. O Caiuajara será o pterossauro mais bem descrito e não somente baseado em um único exemplar, mas em dezenas", afirma.
Desde o início da pesquisa até agora já se passaram dois anos e meio. E o recente artigo publicado em uma revista cientifica americana já chama atenção da comunidade internacional. As características mais marcantes dessa nova espécie para os pterossauros já catalogados, segundo o pesquisador, estão no crânio, o bico curvado para baixo e uma concavidade presente na parte inferior da mandíbula.
Para entendermos a grandiosidade dessa descoberta para a comunidade cientifica, kellner exemplifica que de 200 espécies existentes, cerca de 150 são válidas e destas 90% são baseadas em pedaços, mas esses são os fósseis mais completos já encontrados, em grande quantidade e de uma mesma espécie. "Poderemos avaliar as variações de tamanho, por exemplo, que vão desde 65 cm até mais de 2 metros, e outras tantas mudanças anatômicas", completa.