Satélites de Elon Musk estão 'bloqueando' nossa visão do Universo, aponta estudo

Nova geração de satélites Starlink, que fornecem internet rápida ao redor do mundo, está interferindo gravemente com radiotelescópios, segundo novo estudo.

18 set 2024 - 17h20
Artwork showing a group of satellites orbiting Earth
Artwork showing a group of satellites orbiting Earth
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

As ondas de rádio da crescente rede de satélites Starlink, do bilionário Elon Musk, estão bloqueando a capacidade dos cientistas de observar o Universo, de acordo com astrônomos na Holanda.

A nova geração de satélites Starlink, que fornecem internet rápida ao redor do mundo, está interferindo mais com radiotelescópios do que as versões anteriores, dizem os cientistas.

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Os milhares de satélites em órbita estão "cegando" radiotelescópios e podem estar atrapalhando pesquisas de astronomia, de acordo com o Instituto Holandês de Radioastronomia (Astron).

A Starlink é um braço da SpaceX, a companhia de exploração espacial de Elon Musk, que também é dono da rede social X.

A SpaceX não respondeu a um pedido de comentário da BBC News.

Os satélites fornecem internet de banda larga ao redor do mundo, geralmente para lugares remotos, incluindo locais desafiadores para a instalação e manutenção de redes de telecomunicação, como Ucrânia e Iêmen e também na Amazônia.

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Em 2022, os testes mostraram que a Starlink poderia fornecer velocidades de internet quatro vezes mais rápidas do que a média, de acordo com o Departamento de Digital, Cultura, Mídia e Esporte.

Mas os astrônomos dizem que isso tem um custo.

"Cada vez que mais destes satélites são lançados com estes níveis de emissão vemos cada vez menos do céu", disse a professora Jessica Dempsey, diretora do Astron à BBC News.

"Estamos tentando observar coisas como os jatos que são emitidos por buracos negros no centro das galáxias. Também observamos algumas das primeiras galáxias, a milhões e milhões de anos-luz de distância, bem como exoplanetas", disse ela, destacando as áreas que a radiação do satélite está afetando.

A interferência causada por satélites de segunda geração equivale a 32 vezes a interferência gerada pelos satélites de primeira geração, segundo o Astron.

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Satélites da Starlink geralmente são facilmente vistos a olho nu no céu à noite
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Radiação em excesso

A quantidade de radiação emitida excede os regulamentos definidos pelo órgão que regula esta indústria, a União Internacional de Telecomunicações, acrescenta Dempsey.

Uma estimativa sugere que há 6.402 satélites Starlink atualmente em órbita a cerca de 550 km acima da Terra, o que a torna a empresa a maior do setor.

Sua principal concorrente, a OneWeb, tem menos de mil.

Mas esta é uma área de negócios em franco crescimento. A Amazon está desenvolvendo sua própria rede e espera lançar pelo menos 3 mil satélites nos próximos anos.

Até 2030, o número de satélites em órbita deve ultrapassar 100 mil.

O estudo foi feito usando o radiotelescópio LOFAR na Holanda em um único dia em julho no início deste ano.

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Muitos objetos no espaço, incluindo galáxias e planetas distantes, emitem luz no espectro eletromagnético.

Essa radiação viaja como ondas, e radiotelescópios podem captar essas ondas, permitindo obter uma imagem de coisas que não podemos ver com nossos olhos.

Mas essas ondas estão sofrendo interferência de satélites.

Os cientistas encontraram radiação eletromagnética não intencional de quase todos os satélites de segunda geração Starlink observados.

Era cerca de 10 milhões de vezes mais brilhante do que as fontes mais fracas de luz identificadas, eles dizem.

As descobertas foram publicadas no periódico científico Astronomy and Astrophysics.

Os sistemas de internet Starlink podem ser usados ​​em locais remotos, como neste barco no Brasil
Foto: Reuters / BBC News Brasil

O autor principal do estudo, Cees Bassa, diz que este efeito é comparável ao do "o brilho da Lua cheia sobre estrelas mais fracas visíveis a olho nu".

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"Como a SpaceX está lançando cerca de 40 satélites Starlink de segunda geração toda semana, esse problema está se tornando cada vez pior", acrescenta Bassa.

Robert Massey, vice-diretor executivo da Sociedade Real de Astronomia no Reino Unido, diz que "está claro que, se você algo está comprometendo um grande observatório assim, precisamos fazer algo a respeito rapidamente".

Questionado sobre o valor da pesquisa de astronomia, Massey afirma ser "errado dizer que você pode simplesmente descartar alguma forma de ciência".

"As aplicações práticas [destes estudos científicos] podem levar décadas ou até mais tempo, mas podem ser fundamentais."

Cientistas também estão preocupados com a poluição luminosa dos satélites e temem que ela também esteja interferindo nos telescópios ópticos.

Astrônomos dizem que conversaram com a SpaceX sobre a radiação da primeira geração de satélites.

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Mas o Astron diz agora que a radiação emitida pela segunda geração foi considerada ainda mais potente.

"Constatar isso foi um pouco chocante", diz Dempsey.

"Isso está realmente ameaçando toda a astronomia terrestre em todos os comprimentos de onda e de maneiras diferentes. Se continuar assim, sem algum tipo de mitigação, se tornará uma ameaça existencial para a astronomia."

Os pesquisadores enfatizam ser necessária uma maior regulamentação do ambiente espacial e de como os satélites operam para evitar que o trabalho científico seja comprometido.

Eles dizem ainda que, como a maior fornecedora de satélites, a SpaceX poderia definir um padrão para limitar estas formas de poluição.

Dempsey diz que ações simples como uma proteção em torno da bateria do satélite poderiam fazer uma grande diferença e reduzir a radiação emitida.

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Alguma interferência vem de eletrônicos defeituosos, então, endereçar isso poderia evitar que isso acontecesse.

Mas, se nenhuma medida for tomada, "muito em brevem as únicas constelações que veremos serão feitas pelo homem", acrescenta Dempsey.

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