Com certeza ter um filho muda a forma de ver o mundo. Mas descobertas apresentadas no encontro anual da Sociedade de Neurociência, o Neuroscience 2022, mostraram novos dados sobre a neurobiologia da experiência materna, nos ajudando a entender como a experiência modifica o cérebro da mãe.
Problema com a saúde mental materna é uma das complicações mais comuns do parto. Nos Estados Unidos, de 3,5 milhões de pessoas que dão à luz por ano, 20% são impactadas com problemas do tipo. No Brasil, sabe-se que 1 em cada 4 mulheres que dão à luz têm depressão pós-parto (especificamente 26,3%).
Quando não tratadas, condições tanto de depressão quanto de ansiedade relacionadas ao parto podem trazer consequências negativas a longo prazo, não apenas para os pais, mas também para os bebês e famílias.
Na conferência, os pesquisadores concluíram que experiências reprodutivas, como a gravidez e o nascimento, exercem efeitos duradouros na organização estrutural e funcional do cérebro materno.
Mas também foram discutidos estudos em modelos animais, que estão sendo feitos para identificar os mecanismos fisiológicos que podem estar por trás dessas alterações cerebrais.
O que pesquisadores dizem sobre o tema
Uma das descobertas mais relevantes foi feita pela equipe de Janace Gifford, da Universidade de Delaware, e diz que a suscetibilidade da mãe a ter depressão pós-parto, em um modelo de roedores, está associada a alterações de hormônios e marcadores neuroimunes.
A partir dessa informação, é possível medir o risco que cada pessoa tem de desenvolver a condição, com biomarcadores de risco, assim como pensar em formas de tratamento.
De acordo com a pesquisa de Gifford, 70% das mulheres experimentam tristeza, falta de interesse (anedonia), ansiedade ou outros distúrbios de humor nas semanas seguintes ao nascimento do filho. E cerca de 20% delas podem desenvolver depressão pós-parto grave e persistente. Em ratos, os que tinham falta de interesse apresentaram mais ansiedade e menor propensão para cuidar dos filhotes.
Outro avanço relevante encontrado foi do grupo do pesquisador Ian S. Maze, da Escola de Medicina Icahn no Monte Sinai. O estudo diz que há conhecimento limitado sobre o que modifica a estrutura cerebral: se é a gravidez ou se são as experiências estressantes depois que a criança nasce.
Camundongos que deram à luz, na pesquisa de Maze, demonstraram melhor desempenho em tarefas de aprendizagem espacial e exibiram padrões bem diferentes de expressão genética no hipocampo, uma estrutura cerebral importante para o aprendizado e memória, em comparação com camundongos que não deram à luz. Porém, o estresse crônico do período pós-parto é capaz de acabar com essas mudanças.
Jamie Maguire, da Escola de Medicina da Universidade Tufts, concluiu ainda que o Brexanolone (aloregnanolone), medicamento recentemente aprovado pela agência reguladora Food and Drug Administration (FDA), nos EUA, tem efeitos a longo prazo porque atua na coordenação de atividades em regiões cerebrais implicadas no humor.
O fluxo dessas redes cerebrais, inicialmente, é interrompido pelo estresse crônico, um dos principais fatores de risco para depressão e ansiedade, mas pode ser parcialmente restaurado pelo medicamento.
"Essas investigações sobre o cérebro materno fornecem insights importantes sobre a neurociência da paternidade e têm implicações para o direcionamento e tratamento de doenças mentais perinatais”, afirmou a neurocientista e psicoterapeuta Jodi Pawluski, mediadora da conferência.