Como o cérebro humano lida com o Tinder

19 dez 2015 - 15h16
(atualizado em 21/12/2015 às 10h35)
Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

O primeiro homem que Sally conheceu no Tinder parecia promissor.

"Tivemos uns papos muito bons", diz. Eles saíram mais duas vezes e se falavam constantemente, tendo trocado cerca de 80 mensagens.

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E aí, sem nenhuma explicação, ele mandou uma mensagem cortando ela de sua vida.

"Como ele não tinha nenhuma ligação comigo, ele foi brutal", diz Sally, de 30 anos, uma maquiadora de Londres.

Ela aderiu ao Tinder há dois anos, após o fim de um relacionamento, e há pouco tempo se inscreveu no happn, outro app que junta pessoas que já cruzaram seus caminhos (fisicamente).

Mas, com o tempo, ela ficou receosa sobre aplicativos de namoro. "Toda essa ideia de satisfação instantânea estragou o sexo para um geração inteira de mulheres", diz ela.

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O Tinder funciona assim: o usuário vê a foto de uma pessoa e, se gostar, desliza a tela para a direita (ou clica duas vezes para indicar que gostou daquela pessoa). Se não, desliza para a esquerda, e essa pessoa desaparece do seu "catálogo" de perfis.

Sally viu relacionamento terminar abruptamente no Tinder
Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

Fim do romantismo?

O app, que segundo o site The Drum é responsável por 8 bilhões de conexões sobre 196 países, é o mais popular do tipo no mundo.

Os usuários arrastam a tela 97,2 mil vezes por minuto e o usuário médio passa 11 minutos por dia olhando perfis de potenciais pares (os "matches" do Tinder").

Mas é comum ouvir uma pessoa lamentando o tipo de comportamento que o Tinder, teoricamente, incentiva. Há notícias sobre o "apocalipse dos encontros" que "mata" ou "varre" o romantismo, enquanto outros denunciam que ele está acabando com a sociedade.

Mulheres jovens reclamam que suas caixas de entradas estão recebendo imagens não solicitadas e não bem-vindas de pênis de estranhos.

"É como um catálogo de loja de departamento, com tudo disponível - é o equivalente a ter centenas de homens em pé em um bar te dizendo o quanto gostam de você, mas te dispensando no minuto em que uma mulher mais gostosa aparece", diz Sally.

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Assim como o Tinder, outros aplicativos de paquera são muito populares. O site eHarmony tem mais de 66 milhões de usuários, e 7,3 milhões de mensagens são enviadas pelo OkCupide todos os dias.

Seres humanos evoluíram ao longo de dois milhões de anos para desenvolver o mais complexo sistema central existente - e para serem principalmente monógamos.

Se é assim, as pessoas estão preparadas para lidar com a anonimidade e a variedade de escolhas que esses aplicativos oferecem?

Não há nada novo em olhar fotos para escolher um parceiro, diz Lucy Brown, professora do Einstein College of Medicine, em Nova York, e coautora de diversos artigos sobre a neurobiologia do amor romântico.

Pouco eficiente

O rei da Inglaterra Henrique 8º encomendou um retrato de Anne de Cleves para ajudá-lo a decidir sobre o potencial dela para o casamento, diz Brown. Mas ela alerta que isso não é uma forma especialmente eficiente de escolher alguém.

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Humanos são programados para julgar as pessoas após vê-las "em movimento", diz ela, e não por meio de uma mistura de imagens paradas e mensagens em uma tela.

"É muito perigoso - você não consegue saber muito por uma foto", diz Brown. "O cérebro humano é programado para considerar em detalhes como uma pessoa se mexe ou o jeito que ri." Então faz sentido conhecer a pessoa ao vivo o quanto antes.

Segundo ela, são precisos, em média, três anos vivendo junto com alguém até esta pessoa se revelar por inteiro. Mas apps como o Tinder são mais conhecidos por facilitar relacionamentos de curta duração.

Tomografia mostra que se apaixonar causa mudanças químicas no cérebro
Foto: Lucy Brown / BBC News Brasil

E isso é um dos medos mais comuns expressados sobre o impacto social de aplicativos de paquera - que a promessa de uma escolha infinita incentive as pessoas a buscar a animação de casos curtos em vez de investir em uma parceria de longo prazo. "Essa é a preocupação - que as mulheres sejam tão acessíveis."

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Existem provas que sugerem que mudanças clínicas importantes acontecem dentro do cérebro durante os primeiros dias de um relacionamento.

Mudanças no cérebro

Um estudo feito pela Universidade de Pisa em 1999 descobriu que os níveis do químico "mensageiro cerebral" serotonina em pessoas passando pela fase inicial do amor eram comparáveis aos níveis daqueles que têm transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).

E, em 2007, cientistas da Universidade da Basiléia descobriram que esse primeira estágio de paixão é comparável à hipomania - um estado de energia alta, menos inibição e menos necessidade de dormir.

A professora Bianca Acevedo, pesquisadora da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), diz que há um aumento de dopamina - um químico que transmite sinais para o cérebro - nos estágios iniciais de um relacionamento, o que faz com que as pessoas fiquem animadas.

Esse sistema de recompensa inconsciente é algo em que as pessoas precisam ser viciadas "pela nossa sobrevivência".

"Elas precisam da energia extra para começar um relacionamento e fazer as coisas que são feitas, como ficar acordado a noite inteira e pensar na pessoa o tempo todo quando não está com ela."

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No entanto, isso não garante o fim dos encontros ruins ou resolve o outro dilema dos encontros marcados online, na opinião de Sally: como se livrar de uma pessoa o mais rápido possível mas de forma educada.

"Não há nada pior do que sentar lá e dizer 'ah, esse restaurante está acabado porque eu dividi ele com você'."

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