Fim do carro a gasolina: o que falta para chegarmos lá?

Urgência climática tem levado países a instituírem planos para abandonar a gasolina. Quando isso será uma regra para o mundo?

12 set 2022 - 05h01
Pode parecer distante pensar no fim da gasolina, mas países em todo o mundo já pensam essa solução
Pode parecer distante pensar no fim da gasolina, mas países em todo o mundo já pensam essa solução
Foto: IADE-Michoko / Pixabay

Em um contexto em que se fala tanto sobre gasolina e suas variações de preço, parece uma realidade distante pensar em um mundo sem gasolina ou combustíveis fósseis. Mas talvez esse não seja um sonho tão distante assim: a Califórnia, que é estado com o maior mercado automotivo dos Estados Unidos, já definiu que quer abolir o uso da gasolina como combustível até 2035. 

As medidas, vistas pelo presidente da Aliança para Inovação Automotiva, John Bozzella, como "extremamente desafiadoras", acendem um alerta sobre esse tema no mundo e também no Brasil. Na Noruega, o prazo para acabarem as emissões de motores térmicos é ainda menor, para 2025. Para o Japão, a ideia é zerar a emissão de carbono até 2050.

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As três principais candidatas a substituírem a gasolina são a eletricidade, ou seja, os carros elétricos; o etanol; e o hidrogênio. Mas problemas como a produção custosa dessas alternativas e os preços altos dos carros elétricos ainda podem levar a uma transição demorada.

A promessa dos carros elétricos

Os carros elétricos são a opção "verde" mais em alta hoje em dia. Para Leandro Tessler, físico e professor do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp, o problema deles “não são os motores, mas sim estocar energia elétrica de forma eficiente e economicamente viável”.

No mercado europeu, há excelentes exemplos de países em que a eletrificação está muito avançada, além de bons programas de incentivo ao uso do carro elétrico em detrimento ao carro a combustão. Como exemplo, a Volkswagen e a Bosch concordaram em formar uma joint venture até o fim do ano para equipar fábricas de células de bateria e ajudar a tornar a Europa autossuficiente no setor.

Mas é importante não esquecer da forma pela qual a eletricidade é gerada. Na Europa, uma significativa parcela da energia vem de usinas termelétricas a carvão, que não combinam com o apelo não poluente do veículo elétrico. Assim, se a usina termelétrica produzir mais energia para abastecer carros elétricos, poluirá mais o ambiente também.

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Carros elétricos são muito atrativos, mas na Europa uma significativa parcela da energia produzida é oriunda de usinas termelétricas a carvão
Foto: andreas160578 / Pixabay

Apesar de parecer um cenário não muito favorável, Fábio Delatore, professor de engenharia elétrica da Fundação Educacional Inaciana (FEI), diz que as emissões de poluentes em um veículo a combustão já são controladas com modernos sistemas de gerenciamento, catalisadores e outros recursos desenvolvidos pelas montadoras, que precisam ser compactos e leves.

"Mas para o seu bom funcionamento, dependem exclusivamente que o dono do veículo faça as manutenções preventivas e corretivas para que tudo funcione a contento”, explica Delatore.

Já na termoelétrica, é possível um controle de poluição produzido pela queima do carvão ou combustível fóssil por meio dos limites de espaço e peso das usinas, além de manutenções periódicas. Isso favoreceria um panorama apenas com carros elétricos nas ruas, e ainda compensaria usá-los como energia mais limpa, na comparação com a gasolina.

Hoje, o que mais temos são os chamados veículos elétricos híbridos, que usam um motor principal a combustão interna e um motor elétrico complementar para aumentar a eficiência do carro. 

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Países como a China, de acordo com a Bloomberg, já contam com mais de 300 marcas encarregadas da produção de veículos elétricos no país, muitos com preços competitivos até mesmo para o mercado chinês (cerca de R$ 30 mil).

No Brasil, os preços dos carros elétricos ainda são altos, na média dos R$ 150 mil – todos importados. Alguns entraves são a baixa autonomia das baterias e a necessidade de uma infraestrutura no Brasil com muitos pontos de recarga de baterias e implantação de eletropostos, algo que ainda não existe de forma ampla.

O etanol é um biocombustível produzido a partir da cana de açúcar; ainda assim, libera CO2, mas em menores quantidades que a gasolina
Foto: Corinna Schenk / Pixabay

Etanol, combustível orgulho brasileiro

Segundo Delatore, o etanol — ou "álcool", como é conhecido popularmente por vir da cana-de-açúcar — já apresenta vantagens em relação à gasolina. Além do CO2, a gasolina emite óxido de nitrogênio (NOx), monóxido de carbono (CO) e hidrocarbonetos não queimados (HC). Já o etanol também emite CO2, mas em menores quantidades. Por isso, é considerado uma fonte de energia renovável. 

Portanto, o ganho ambiental do uso do etanol é inegável. O problema estaria na economia, que sobretudo no Brasil, ainda é muito pautada pela gasolina e na atuação da estatal Petrobras, que extrai petróleo em águas marítimas profundas.

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Frente a situações como a Guerra da Ucrânia e à inflação que assola o Brasil, o etanol também é uma alternativa para conter os altos preços da gasolina no mercado. O economista Paulo Feldmann, ex-presidente da EletroPaulo e professor de economia da USP (Universidade de São Paulo), é um dos defensores desse combustível.

"O Proálcool (Programa Nacional do Álcool) foi criado há quase 50 anos e permitiu que o Brasil se saísse melhor que outros países nas crises mundiais anteriores. Mas o programa entrava em crise nos períodos em que o petróleo caía muito de preço. (...) Precisamos retomar o Proálcool, obviamente com novo formato, para que o mesmo não tenha que oscilar conforme as crises mundiais", disse em sua coluna para a "Folha de S. Paulo" em março.

Hidrogênio pode ser muito útil para abastecer transporte de grandes distâncias, como navios e trens
Foto: Melanie Hughes / Unsplash

Hidrogênio é viável?

Os carros movidos a hidrogênio são outra opção promissora para substituírem a gasolina. Ao contrário do que se pode imaginar, eles não usam o hidrogênio para gerar combustão. O sistema energético é bem mais complexo. 

O carro armazena o hidrogênio em estado líquido, sob pressão, em um tanque. De lá, ele vai para a célula do combustível, e só então encontra o oxigênio da atmosfera, transformando-se em energia. 

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Segundo Eduardo Lucena, doutor em hidráulica e saneamento pela USP, o veículo a célula de hidrogênio só produz vapor de água e energia elétrica. “Não existe o motor de combustão interna, mas uma célula combustível com um tanque de gás hidrogênio que o alimenta e transforma em energia. Então é um carro altamente seguro, que pode ter uma grande autonomia e zero poluente”, afirma o professor. 

O hidrogênio pode ser muito útil em grandes distâncias porque o seu armazenamento em estado líquido permite um abastecimento rápido. “[Seria usado em] caminhões e ônibus, e até navios e trens, que derramam óleo diesel como seu principal combustível”, exemplifica Delatore.

Até temos carros movidos a hidrogênio no Brasil. É o caso de algumas frotas de ônibus de São Paulo, mas que ainda são muito pequenas em relação à necessidade ambiental. “Existem países à frente em tecnologias de células de combustível movidas a hidrogênio, como os Estados Unidos, Japão e também Alemanha”, explica Lucena.

A gasolina vai deixar de existir, afinal?

Os especialistas ainda são bastante céticos ao esperar uma substituição total da gasolina por alternativas menos poluentes. Para Delatore, a solução não será a mesma em todos os casos, mas virá da união de diferentes propostas em contextos variados.

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"Eu considero bem difícil a gente fazer a substituição total. Acho que nós precisamos é diversificar nossa matriz energética com tecnologias cada vez mais verdes", diz Lucena. 

"Toda a indústria de petróleo sabe que sua matéria prima é finita. (...) Os maiores desafios para implementação massiva de veículos elétricos no Brasil são de desenvolvimento tecnológico e de infraestrutura. É preciso investir em geração e especialmente distribuição de eletricidade para atender a nova demanda", explica Tessler.

Fonte: Redação Byte
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