Há quase vinte anos, dois físicos da Universidade de Manchester, no Reino Unido, Andre Geim e Konstantin Novoselov, publicaram um artigo inovador sobre o "efeito do campo elétrico em filmes de carbono atomicamente finos". O trabalho deles descrevia as extraordinárias propriedades eletrônicas do grafeno, uma forma cristalina de carbono equivalente a uma única camada de grafite, com apenas um átomo de espessura.
Por volta desta época, comecei meu doutorado na Universidade de Surrey, no Reino Unido. Nossa equipe era especializada nas propriedades eletrônicas do carbono.
Os nanotubos de carbono eram a última tendência, que eu estava acompanhando com prazer. Um dia, meu professor incentivou alguns de nós a ir a Londres para assistir a uma palestra de um conhecido divulgador científico da Universidade de Manchester. Era Andre Geim.
Não ficamos desapontados. Ele foi inspirador para nós, estudantes de doutorado recém-formados, incluindo uma conversa de sexta-feira à tarde, do tipo das que falam em sapos levitando, sobre experimentos excêntricos, antes de começarmos a falar sobre carbono atomicamente fino.
Mesmo assim, estávamos céticos em relação a este conceito de carbono. Não conseguíamos acreditar que um material obtido, na prática, a partir de grafite de lápis e fita adesiva fosse realmente o que dizia ser. Mas estávamos errados.
O trabalho foi rapidamente copiado e reproduzido por cientistas em todo o mundo. Novos métodos para fabricar este material foram concebidos. Alegações incríveis sobre suas propriedades o faziam soar como algo saído de uma história em quadrinhos de Stan Lee.
Mais forte que o aço, altamente flexível, superescorregadio e impermeável a gases. Um condutor eletrônico melhor do que o cobre, e um condutor térmico melhor do que o diamante, além de ser praticamente invisível e apresentar uma série de propriedades quânticas exóticas.
O grafeno foi aclamado como um material revolucionário, prometendo eletrônicos ultrarrápidos, supercomputadores e materiais super-resistentes.
Alegações mais fantásticas incluíam elevadores espaciais, velas solares, retinas artificiais e até mesmo mantos de invisibilidade.
Apenas seis anos após seu trabalho inicial, Geim e Novoselov ganharam o Prêmio Nobel de Física, alimentando ainda mais o entusiasmo em torno desta maravilha. Desde então, centenas de milhares de artigos acadêmicos foram publicados sobre o grafeno e materiais relacionados.
Mas nem todos estão de acordo. Basta dar uma olhada na seção de comentários de qualquer artigo popular sobre o material — e você rapidamente vai se deparar com os céticos. Eles reclamam que passamos décadas ouvindo promessas vazias sobre o impacto do grafeno no mundo real. E questionam onde estão os produtos revolucionários que vão enriquecer nossas vidas ou salvar o mundo das mudanças climáticas.
Mas, afinal, o grafeno foi um sucesso retumbante ou um fracasso? Como costuma acontecer, a realidade está em algum ponto intermediário.
Altos e baixos do grafeno
Em termos de percepção pública, é justo dizer que o grafeno tem sido submetido a a expectativas irrealistas. A mídia popular certamente pode exagerar as histórias científicas para obter cliques, mas os acadêmicos — inclusive eu — também não estão imunes a exageros ou especulações sobre seus projetos favoritos.
Eu diria que isso pode até ser útil, ajudando a impulsionar novas tecnologias. Da mesma forma, porém, pode haver uma reação negativa quando o avanço parece decepcionante.
Dito isso, tecnologias revolucionárias, como os carros, a televisão ou o plástico, exigiram décadas de desenvolvimento. O grafeno ainda é um recém-chegado, portanto, é muito cedo para tirar conclusões sobre seu impacto.
O que tem acontecido discretamente é uma constante integração do grafeno em uma série de aplicações práticas. Grande parte disso se deve ao Graphene Flagship, uma importante iniciativa de pesquisa europeia coordenada pela Universidade de Tecnologia de Chalmers, na Suécia.
O objetivo é levar o grafeno e os materiais relacionados da pesquisa acadêmica para aplicações comerciais no mundo real — e, como resultado, mais de 90 produtos foram desenvolvidos na última década.
Entre eles, estão plásticos mistos para equipamentos esportivos de alta performance, pneus de corrida mais duráveis para bicicletas, capacetes para motociclistas que distribuem melhor as forças de impacto, revestimentos termicamente condutores para componentes de motocicletas e lubrificantes para reduzir o atrito e o desgaste entre peças mecânicas.
O grafeno está encontrando seu lugar em baterias e supercapacitores, permitindo carregamento mais rápido e vida útil mais longa. As tintas condutoras de grafeno agora são usadas para fabricar sensores, tags de rastreamento sem fio, elementos de aquecedores e blindagem eletromagnética para proteger eletrônicos sensíveis.
O grafeno é usado até mesmo em fones de ouvido para melhorar a qualidade do som e como um meio mais eficiente de transmissão de calor em aparelhos de ar-condicionado.
Produtos de óxido de grafeno estão sendo usados para dessalinização, tratamento de águas residuais e purificação de água potável. Enquanto isso, uma variedade de materiais de grafeno pode ser comprada para uso em uma série de outros produtos.
E há rumores, ou sabe-se, que grandes corporações, incluindo SpaceX, Tesla, Panasonic, Samsung, Sony e Apple, estão usando o material para desenvolver novos produtos.
Da promessa à praticidade
O impacto do grafeno na ciência dos materiais é inegável. O impacto sobre os produtos de consumo é tangível, mas não tão visível.
Depois que um material é incorporado em um produto funcional, não há necessidade de continuar mencionando seu nome, e as preocupações relativas à propriedade podem fazer com que as empresas relutem em entrar em detalhes de qualquer forma. Portanto, os consumidores podem não saber que seu carro, telefone celular ou taco de golfe contêm grafeno e, provavelmente, não se importam, desde que funcionem.
À medida que os métodos de produção melhoram e os custos diminuem, podemos esperar que o grafeno seja cada vez mais adotado. A economia de escala vai torná-lo mais acessível, e a variedade de aplicações provavelmente vai continuar a se expandir.
Pessoalmente, depois de duas décadas, ainda fico empolgado quando tento algo novo com grafeno em laboratório. Embora eu possa ser culpado de ter contribuído para o hype inicial, continuo otimista sobre o potencial do grafeno.
Ainda estou aguardando para pegar um elevador espacial, mas, enquanto isso, vou me consolar com o fato de que o grafeno já está ajudando a construir um futuro melhor — de forma silenciosa e constante.
* Stephen Lyth é bolsista do programa Strathclyde Chancellor, pesquisador de engenharia química e de processos na Universidade de Strathclyde, na Escócia.
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).