Inteligência artificial tem ou terá QI maior que humano? Veja diferenças

Discussão foi levantada durante podcast com influenciador Felipe Castanhari; especialista diz a Byte que não vê ameaça no futuro próximo

12 jul 2023 - 09h47
Embora seja possível comparar inteligência de robôs com humanos, professor não acredita que máquinas irão superar pessoas tão cedo
Embora seja possível comparar inteligência de robôs com humanos, professor não acredita que máquinas irão superar pessoas tão cedo
Foto: Yurchanka Siarhei | Shutterstock / Portal EdiCase

Uma questão importante sobre inteligência artificial (IA) tem tomado conta das redes sociais nos últimos dias: quem tem o QI (quociente de inteligência) mais alto, o homem ou a máquina? 

A opinião mais recente partiu do youtuber Felipe Castanhari em uma participação no podcast Podpah; ele fez uma comparação do QI do ChatGPT, da OpenAI — que ele afirma ser de "mais ou menos" 155 — com o do cientista Albert Einstein, que era de 160.

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Na fala de Castanhari, o youtuber diz que uma futura possível atualização do programa, ainda não confirmada pela empresa, seria dez vezes maior, superando o de Einstein.

"Se o Einstein, tendo duas vezes o QI de uma pessoa mais lentinha, conseguiu transformar totalmente a Humanidade.... A gente não teria GPS se não fosse Einstein. (...) então a gente está a uma atualização...", disse Castanhari. "Da era de Ultron", completou o apresentador Cauê Moura, comparando a IA com o robótico supervilão do universo Marvel.

O conteúdo viralizou com usuários questionando se, de fato, é possível comparar certos tipos de inteligência artificial, como o modelo de linguagem de grande escala (LLM), com a de humanos. O grande argumento de quem é contra essa comparação é que não é possível dizer que há “inteligência” real nos LLMs.

Isso porque eles são sistemas treinados com grandes volumes de dados, que realizam matemática e estatística em alta velocidade para prever sequências de palavras. O modelo não tem consciência do que está respondendo ao gerar texto.

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O que é QI, afinal?

Para essa discussão fazer sentido, primeiro é necessário recuperar o significado de QI. O termo foi criado pelo psicólogo alemão William Stern em 1912 e funciona como uma medida da capacidade de raciocínio de um indivíduo.

Em outras palavras, o quociente mede o quanto uma pessoa pode usar de lógica e informações para responder perguntas ou chegar a conclusões razoáveis de conhecimento. Os testes de medição de QI são projetados para avaliar as habilidades cognitivas em várias áreas, como raciocínio lógico, memória, habilidades verbais e habilidades visuais-espaciais. 

Esses testes geralmente envolvem uma série de perguntas, que variam em formato e complexidade, com o objetivo de medir a capacidade de solucionar problemas.

No entanto, os testes de QI têm suas limitações e não são capazes de medir totalmente a inteligência ou prever o sucesso em todas as áreas da vida. Afinal. existem muitos outros aspectos que contribuem para a inteligência e o desempenho humano.

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QI de humanos x inteligência artificial 

Felipe Castanhari não foi o único a comparar recentemente a mente humana com a de robôs. Conhecido como "padrinho da IA", o psicólogo e cientista da computação Geoffrey Hinton pediu para se afastar do Google em maio. Na ocasião, afirmou que a inteligência artificial em modelos como o ChatGPT poderá, no futuro, superar a de humanos.

Apesar das afirmações causarem estranheza, o pós-doutor em neurociências e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e autor do livro “De Futuro em Futuro”, Álvaro Machado Dias, disse em entrevista ao Byte que a comparação entre o QI humano e a de robôs é viável e esperada. Mas há ressalvas sobre a possível superação à inteligência do homem.

Afinal, a IA poderá até superar os humanos em tarefas específicas, como cálculos complexos ou reconhecimento de padrões. Mas a inteligência de uma pessoa continua a ser única em sua capacidade de compreender e interagir com o mundo de maneira geral.

“O teste de QI é baseado em um teste de raciocínio que uma IA consegue emular. A discussão diferente é se a IA consegue superar o humano no ambiente interágico”, avaliou o neurocientista.

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Discussão que viralizou nas redes sociais compara QI de máquina com humanos
Foto: Canaltech

Tarefa difícil

A tarefa de comparar a inteligência humana com a artificial é um desafio complexo devido à natureza diferente desses dois tipos. De um lado, a inteligência do indivíduo é moldada pela nossa experiência, emoções, intuição e capacidade de adaptação; do outro, a IA é baseada em algoritmos, cálculos e modelos matemáticos. 

Outro ponto é que a inteligência humana também é caracterizada por uma ampla gama de habilidades, como criatividade, empatia, senso ético e pensamento crítico, que são difíceis de serem replicadas pela IA. 

Já a medição da capacidade da inteligência artificial geralmente é avaliada por meio de benchmarks e testes de desempenho específicos. Esses exercícios podem incluir tarefas como reconhecimento de imagem, processamento de linguagem natural e jogos estratégicos. 

Um artigo publicado na revista científica Scientific American em março deste ano demonstrou a mesma dúvida: saber qual o QI do ChatGPT, já que ele se mostrou o candidato ideal em diversas matérias e provas para universidades. 

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O autor, Eka Roivainen, é psicólogo de avaliação no Oulu University Hospital, na Finlândia, e resolveu testar a inteligência da máquina baseando-se em perguntas-testes feitas para humanos. 

O teste usou a escala Wechsler de inteligência para adultos (WAIS), mais comumente usada para medir o QI. A terceira edição utilizada no experimento consiste em seis subtestes verbais e cinco subtestes não-verbais que compõem os componentes Verbal IQ e Performance IQ, respectivamente. 

No estudo, foi possível testar o ChatGPT porque cinco dos subtestes da escala de QI verbal – vocabulário, semelhanças, compreensão, informação e aritmética – podem ser apresentados na forma escrita. 

Um sexto subteste da escala de QI verbal é o Digit Span, que mede a memória de curto prazo. Mas não pode ser administrado ao chatbot, devido à falta do circuito neural relevante que armazena brevemente informações como um nome ou número.

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Estimado com base em cinco subtestes, o QI verbal do ChatGPT foi de 155, superior a 99,9% dos examinandos que compõem a amostra de padronização americana WAIS III de 2.450 pessoas. 

“Como o chatbot não possui os olhos, ouvidos e mãos necessários, ele não é capaz de realizar os subtestes não-verbais do WAIS. Mas as escalas de Verbal IQ e de Full Scale IQ estão altamente correlacionadas na amostra de padronização, então o ChatGPT parece ser muito inteligente para qualquer padrão humano”, escreveu o autor.

Ao comentar o teste da Scientific American e as falas de Castanhari, Diogo Cortiz, professor da PUC-SP e pesquisador no NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR), disse em um post no Linkedin que "não existe consenso sobre o que é inteligência e nem sobre como medi-la".

"A própria OpenAI afirmou que não está treinando o GPT-5, então qualquer fala sobre a sua capacidade é especulação. Não há como saber que o GPT não tenha sido treinado com esse tipo de teste. Pode ser que estamos dando uma prova para quem tem o gabarito", concluiu.

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Máquinas têm dificuldades em responder perguntas que precisam de raciocínio lógico
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

As máquinas e as pessoas 

E é esse o ponto-chave para a discussão de que um robô poderia superar o QI de Einstein: tais máquinas não existem ainda e estão longe disso, segundo Machado Dias.

De acordo com o neurocientista, se houver um algoritmo do ChatGPT-5 ou ChatGPT-6, ele pode até ter uma performance melhor do que 99% dos alunos brasileiros no Enem, por exemplo. Mas isso não quer dizer que esses modelos estejam superando a inteligência humana em outras dimensões. 

“Existem limitações. A ideia de comparar a base dos algoritmos atuais ao ser humano funciona quando usamos testes psicométricos muito precisos [como QI], mas no mundo real isso não tem sentido”, afirma. 

Outro exemplo mais prático é que, apesar do seu alto QI, o ChatGPT ainda falha em tarefas que exigem um raciocínio humano real ou uma compreensão do mundo físico e social. No dia 5 de julho a reportagem de Byte fez um teste com a inteligência artificial da OpenAi e perguntamos: “Qual é o primeiro nome do pai dos filhos de Sebastian?"

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O ChatGPT respondeu: "Lamento, mas como um modelo de linguagem baseado em texto, não tenho acesso a informações em tempo real sobre indivíduos específicos, como Sebastian ou sua família. Além disso, sem contexto adicional ou detalhes específicos, não posso fornecer o primeiro nome do pai dos filhos de Sebastian."

Nesta situação, o ChatGPT falha em raciocinar logicamente e tenta confiar em seu vasto banco de dados com o termo “Sebastian” mencionados em textos online.

Por essa razão, Machado Dias não acredita que modelos de inteligência artificial com o QI alto possam superar humanos em um futuro próximo. Mas o professor avalia que o pode pode acontecer é uma facilitação das descobertas científicas por conta dos algoritmos. 

"Isso já está acontecendo e vai acontecer cada vez mais. Mas achar que o próximo Einstein é um algoritmo é uma ingenuidade total", disse.

Fonte: Redação Byte
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