A cúpula NetMundial - Encontro Multissetorial Global Sobre o Futuro da Governança da Internet - exige uma gestão multilateral da Internet para reduzir a hegemonia "de facto" dos EUA sobre a rede, segundo o documento divulgado nesta quinta à noite no final do encontro em São Paulo.
A governança da Internet deve ser "inclusiva" e "transparente" e permitir "a participação de múltiplos atores", destaca o documento, que também condenou a "vigilância em massa e arbitrária" na rede.
Para os cerca de mil participantes que compareceram a esse encontro de dois dias em São Paulo, a Internet deve ser "inclusiva, transparente e responsável e suas estruturas e operações devem seguir uma abordagem que permita a participação de múltiplos atores".
A governança da Internet precisa se dirigir para o objetivo de estabelecer uma rede global, estável, flexível, descentralizada, segura e interconectada, "disponível para todos", ressalta o texto.
"Seus padrões devem ser consistentes com os direitos humanos", enfatiza o documento, adotado por consenso e sem natureza vinculante para governos, empresas e outras organizações.
Por razões sobretudo históricas, os Estados Unidos sediam os principais organismos que administram os endereços, domínios, normas e protocolos da web, o que há anos irrita vários governos.
Durante a abertura da cúpula, a presidente Dilma Rousseff declarou que nenhum país "deve ter mais peso do que outro" na gestão da Internet e pediu aos demais países em desenvolvimento que participem desse processo.
A participação ampla e representativa na gestão da Internet foi uma reivindicação geral nesses dois dias de discussões, durante os quais se reafirmou que governos e sociedade devem ter voz e voto.
A NetMundial também condenou fortemente a espionagem eletrônica, alguns meses após o escândalo deflagrado pelas revelações do ex-analista de Inteligência americano Edward Snowden. De acordo com o material vazado pelo consultor hoje asilado na Rússia, o governo americano espionou as comunicações de milhões de pessoas, incluindo a presidente Dilma.
"A vigilância em massa e arbitrária enfraquece a confiança na Internet e a confiança no ecossistema de governança da Internet", alerta a declaração.
"A coleta e o uso de dados pessoais por atores governamentais e não governamentais devem ser sujeitos às leis internacionais dos Direitos do Homem", defende a resolução final da cúpula, divulgada nesta quinta-feira à noite.
Em anúncio recente, Washington revelou que cederá a uma entidade multissetorial o controle da ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), corporação internacional encarregada de administrar o sistema mundial de nomes de domínio na Internet.
Com sede na Califórnia, a ICANN tem estado sob a tutela do Departamento de Comércio americano, mas a partir de setembro de 2015 terá um novo sistema de governo por intermédio de uma entidade multilateral.
Um dos criadores da rede, o matemático e informático americano Vint Cerf, destacou em entrevista à AFP que "é um mito" que os Estados Unidos controlem a Internet.
"Os Estados Unidos não controlam a Internet, isso é um mito. Talvez quando começaram a rodar os programas, há 40 anos, sim, mas agora não", afirmou o cientista, lembrando o "papel" chave de seu país na gestão de endereços e domínios na rede.
"A Internet é uma besta incomum, devido a seu caráter transnacional", disse Cerf, que também defende um sistema multilateral e representativo na gestão da web.