Cientistas descartaram a possibilidade de o primeiro paciente a receber um transplante de coração de porco ter falecido por conta de uma infecção com vírus suínos encontrados no órgão. A morte, ao invés disso, teve origem em múltiplos fatores.
Os achados foram compartilhados em um novo estudo publicado na The Lancet no final de junho.
David Bennett, de 57 anos, teve uma parada cardíaca e faleceu dois meses após receber, em janeiro de 2022, um transplante de coração de porco, em um feito inédito da medicina. Ele tinha uma condição cardíaca que o levaria à morte caso não recebesse um novo órgão, mas não era elegível para a fila de corações humanos por ser portador de outras doenças crônicas.
Na nova pesquisa, cientistas analisaram o caso do primeiro xenotransplante (nome dado ao procedimento que ocorre com órgãos de outras espécies animais) para colher aprendizados para procedimentos futuros.
Foi constatado que a parede do músculo cardíaco estava endurecida, havia danos nas paredes internas dos vasos sanguíneos e o coração estava inflamado — problemas atribuídos a uma resposta imune exagerada, possivelmente devido a uma rejeição do órgão.
Durante o tratamento do paciente, os médicos administraram uma substância chamada imunoglobulina intravenosa (IVIG) para ajudar a fortalecer o seu sistema imunológico. No entanto, é possível que a IVIG tenha causado uma resposta imune ao próprio tecido cardíaco.
Não foram encontrados vestígios dos dois vírus suínos encontrados no coração, o citomegalovírus suíno (PCMV) e o vírus da roséola suína (PRV), em outros órgãos, o que descarta a hipótese de infecção generalizada. Entretanto, os médicos observaram que os patógenos podem ter contribuído para deterioração do coração no contexto da resposta imunológica exagerada.
À Folha de São Paulo, o médico Muhammad Mouhidini, envolvido no procedimento, disse que não foi feito um teste específico de reação da IVIG nas células da veia aorta do porco antes da cirurgia.
"No futuro, pretendemos evitar usar imunoglobulina intravenosa e, se isso não for possível, vamos testar o lote total do medicamento contra células do porco doador antes de usá-lo. Além disso, desenvolvemos um teste e vamos também descartar órgãos de porcos que tenham algum dos vírus suínos que foram encontrados dormentes no órgão", disse.