“Barbie” tem um objetivo muito maior do que conquistar as meninas ou vender bonecas. Aliás, tem objetivo maior que estourar na bilheteria. A grande meta da Mattel, dona da marca, é que este seja o primeiro de muitos filmes e séries inspirados em brinquedos da companhia.
É por isso que a Mattel está investindo tanto em marketing para fazer o filme da Barbie repercutir, criando uma verdadeira Barbie mania.
É lógico que o objetivo primário deste investimento é vender ingresso para o cinema. Com certeza a Mattel espera vender muita boneca com este bochicho todo.
O risco financeiro era relativamente pequeno pra empresa. Ainda que o filme não desse lá um lucro tão grande, certamente iria compensar com a receita que viria dos brinquedos.
E não só da criançada, mas também de muitos adultos que estão se entregando ao universo cor de rosa de Barbie, comprando toda espécie de merchandising ligada à franquia.
O orçamento do filme ficou em 100 milhões de dólares. Quando se trata de superproduções desse tipo, normalmente os grandes estúdios de Hollywood investem soma semelhante no marketing. Portanto o custo total deve estar na casa dos 200 milhões de dólares.
A conta tradicional é que a receita total do filme tem que ser pelo três vezes maior que o seu custo para que ela dê lucro. Afinal é preciso pagar impostos e remunerar toda a cadeia de exibição, seja os cinemas ou streaming, TV, DVD etc.
A bilheteria projetada para Barbie é de pelo menos 110 milhões de dólares no primeiro final de semana, só nos Estados Unidos. Já tem especialistas dizendo que o filme pode passar de US$ 800 bi de bilheteria global. Então está indo por um ótimo caminho.
O ponto chave é que o investimento em “Barbie” tem o objetivo de catapultar todo esse universo de marcas de brinquedos para um universo cinematográfico. Uma reportagem recente da revista New York revelou que a Mattel tem 45 filmes planejados, dos quais treze já anunciados. A inspiração óbvia é a Marvel.
O primeiro que deveria chegar seria o novo filme do He-Man, uma produção com a Netflix. Mas ele acabou de ser cancelado. A razão é que o orçamento era gigantesco e hoje todas as empresas de streaming estão apertando os cintos.
Com isso, provavelmente o próximo filme da Mattel que chegará aos cinemas será uma versão do dinossauro Barney. O protagonista é Daniel Kaluuya, o ator inglês mais conhecido por filmes tensos como “Corra” e “Não! Não Olhe!”. Como assim? Barney em versão dark e adulta do dinossauro púrpura amigo da criançada?
Pois aí está a chave da estratégia da Mattel para o cinemas – e para salvar a própria empresa.
Os negócios da Mattel têm enfrentado dificuldades nos últimos anos. É difícil brinquedo físico concorrer com o digital.
As vendas da empresa caíram e o preço de suas ações caiu. O CEO da Mattel, Ynon Kreiz, tem experiência em entretenimento. Ele foi CEO da Fox Kids.
Com Barbie, a primeira coisa que fez foi atrair Margot Robbie como estrela e co-produtora. Ela é conhecidíssima como a sexy supervilã Harlequina. Foi junto bater nas portas dos estúdios com o projeto.
Outro lance ousado foi contratar a diretora Greta Gerwig. Sua experiência é com prestigiosos filmes adultos com foco no público feminino, e não superproduções pra garotada.
Kreiz diz que quer que a Mattel se torne uma empresa "orientada para o conteúdo”. Só não deixou explícito o seguinte: orientada para o conteúdo para adultos. E a prova é que nos EUA, o filme da Barbie é indicado para maiores de 13 anos. Não é para o público que brinca de boneca.
E é claro que com isso vem toda uma abordagem com os valores caros ao público adulto. É a Barbie independente, irônica, metalinguística, "feminista" (não no sentido de mais direitos sociais para o conjunto das mulheres, mas no sentido de empoderamento individual. Barbie CEO, à la USA).
Por isso é que depois de “Barney” virão filmes inspirados nos carrinhos de Hot Wheels (com produção de J.J. Abrams, que recentemente dirigiu Star Wars), nas bonequinhas Polly Pocket e American Girl, no jogo de cartas Uno e por aí vai. Entre o talento anunciado, nomes muito conhecidos estão envolvidos, como Tom Hanks e Vin Diesel.
Mas isso é pra criança?
Pois é justamente este o tema do meu vídeo: porque faz todo sentido transformar brinquedos em entretenimento – mas para adultos!
(*) André Forastieri é jornalista, consultor, sócio da agência Compasso e fundador de Homework. Assine sua newsletter em andreforastieri.com.br.