Na próxima segunda-feira, 23, o Teatro Oficina se despede da temporada de Esperando Godot, que termina seu curso após passar por Santos (SP), Rio de Janeiro (RJ), Portugal e Belo Horizonte (MG), por exemplo. Em entrevista à CARAS Brasil, Marcelo Drummond (61), um dos protagonistas da peça, conta como saiu de um local de zona de conforto com o espetáculo ao lado de Alexandre Borges (58). "A gente consegue jogar".
Escrita em francês pelo irlandês Samuel Beckett (1906-1989) em 1949, a peça é uma das mais montadas do mundo e se consagrou no Brasil na pele de Cacilda Becker (1921-1969) e Walmor Chagas (1930-2013). No Teatro Oficina, já foi montada por Zé Celso em 2001, no Rio de Janeiro, com nomes como Selton Mello (51) no elenco.
Resgatada pelo diretor em 2022 no cenário pós-pandêmico, a obra trouxe dessa vez Marcelo Drummond e Alexandre Borges como a dupla principal da história clássica. Para Drummond, a montagem de agora vem como uma recuperação da história da peça.
"Esperando Godot é sempre atual. Temos a peça como um presente do Zé. O que ele queria a gente faz. O Zé não queria que a gente ficasse numa zona de conforto. A gente passa por coisas durante a peça que a gente tem que lidar", conta o ator, que relembra de um episódio em Portugal, quando uma espécie de lagartixa subiu no seu pé em cena e Alexandre Borges improvisou mostrando o bicho em cena. "Coisas assim acontecem. A gente consegue jogar", define Drummond.
'PAPÉIS QUE ESCOLHERAM A GENTE'
Diferente de montagens recentes com 60 atores no elenco, música e dança,como Mutação de Apoteose e Rasga Coração, Esperando Godot veio na contramão ao trazer um elenco reduzido. "É uma montagem atípica. Eu quis fazer. Eu gosto de fazer teatro", relembra Drummond, que conta que convidou Alexandre Borges e ele topou na hora. "Ele estava saindo da morte da mãe e de uma série de coisas que estava precisando e que no teatro a gente cura", pontua.
Na montagem atual, Drummond e Borges vivem, respectivamente, Estragon (Gogo) e Vladimir (Didi), personagens que, segundo o ator, foram papéis que os escolheram. "São papéis que um monte de gente faz, mas cada um vai fazer de um jeito porque o texto é bom, e a gente é uma dupla que se dá bem em cena. A gente tem um olhar um pro outro. Somos dois atores . O Alexandre é muito bom ator! Ele é um cara que joga muito bem no teatro! É muito bom fazer com ele um texto que assim é puro jogo. É gratificante! O Alexandre é um cara de teatro. Ele tem uma disciplina teatral. Foram papéis que escolheram a gente."
Com ingresso esgotados, Esperando Godot faz suas últimas apresentações neste final de semana, entre sexta, 20, e segunda, 23. Na segunda, o espetáculo realiza sua última apresentação em homenagem à memória de Luís Antônio Martinez Corrêa (1950-1987), irmão de Zé Celso que morreu brutalmente assassinado nesta data há exatos 37 nos. Na ocasião, seu corpo foi encontrado amarrado de pés e mãos com um golpe na cabeça, estrangulado e mutilado com 107 facadas em seu apartamento em Ipanema, no Rio de Janeiro. À época, se deduziu que o assassinato teria sido um crime de intolerância e preconceito com relação a sua homossexualidade. No entanto, não havia discussões no Brasil sobre crime de homofogia.
De lá para cá, Zé Celso passou a fazer uma apresentação na data do crime no Teatro Oficina como uma forma de usar a arte contra a homofobia. "A gente já fazia um movimento contra a homofobia muito antes dos movimentos contra a homofobia virarem comuns, porque o que aconteceu com o Luis Antonio foi um crime homofóbico , de uma fase terrível de homofobia, que continuam fazendo", conclui o ator Marcelo Drummond.