Os diretores nomeados pelo governo Bolsonaro para a Ancine tem seguido a recomendação do presidente para usar "filtros" nos (pouquíssimos) projetos aprovados para captação de recursos.
Na prática, verifica-se uma censura política e ideológica na entidade que deveria fomentar o cinema no Brasil, com a rejeição de um filme sobre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que Bolsonaro já sugeriu matar ("Começando com FHC, não deixando ir para fora, não. Matando!"), e de um documentário sobre o avanço da Igreja Universal do Reino de Deus e de outras denominações evangélicas na política nacional - Os Evangélicos, em desenvolvimento pelos cineastas Helena Solberg e David Meyer.
O avanço político dos pastores tem apoio explícito de Bolsonaro, que recentemente enviou o vice-presidente Mourão a Angola para defender interesses da Igreja Universal naquele país e vergonhosamente nomeou o pastor Marcelo Crivella - que é considerado suspeito de crimes e não pode viajar ao exterior - embaixador do Brasil na África do Sul.
A censura política fica evidente na justificativa dada para o veto ao filme de FHC. Assinada por dois diretores da Ancine no dia 7 de julho, a decisão considera que o longa-metragem "dá margem a inegável promoção da imagem pessoal do ex-presidente da República homenageado no documentário, com notório aproveitamento político, às custas dos cofres públicos".
A mesma Ancine não lembrou destas justificativas ao aprovar um filme sobre a eleição de Bolsonaro, Nem Tudo se Desfaz, do cineasta Josias Teófilo, que antes tinha filmado um documentário bonzinho sobre o infame terraplanista Olavo de Carvalho, mentor do que de pior há no bolsonarismo.
Com relação ao veto do documentário sobre a ambição política da Igreja Universal, a Ancine invocou um artigo que veda "o fomento de conteúdos religiosos ou políticos". "Só que", argumenta Meyer, diretor de Os Evangélicos, "o tal artigo foi revogado pela própria agência há tempos".