“Céu de Agosto”, de Jasmin Tenucci, levou a Menção Especial da Competição Oficial do Festival de Cannes 2021, cujas Palmas foram entregues neste sábado, na França.
“Estou muito feliz e fiquei também muito feliz que a Palma foi para a Tang Yi, de Tian Xia Wu Ya ( All the Crows in the World)”, declarou Jasmin quando questionada na coletiva de imprensa após a premiação.
“A gente tem de ter coragem de desagradar as pessoas às vezes, mas temos de lutar para realizar o que acreditamos”, declarou a diretora brasileira sobre a maior presença de diretoras na premiação oficial deste ano, quando as duas Palmas ( de curtas, para Tang Yi, e a de de longas, para “Titane”, de Julia Ducournau) foram entregues para diretoras.
“Falando sobre o cinema brasileiro, Cannes é uma vitrine enorme e uma honra. Mas neste momento é importante não esquecer dos filmes que não entraram em Cannes. Falando de cineastas brasileiras mulheres, tem tanto filme bom feito por mulheres brasileiras. Há muitas produções de diretoras mulheres acontecendo. Às vezes o filme não entra em um festival importante por alguma razão e é importante bucar e celebrá-los porque muita coisa está acontecendo. Filme muito importantes e relevantes para nossa cinematografia. Espero que mais mulheres venham para Cannes mas já tem muitas mulheres fazendo filmes importantes”, declarou Jasmin ao Plano Geral no início do festival.
“Céu de Agosto” narra a história de Lúcia, uma enfermeira que está grávida e, em um mundo em que o ar está mais do que pesado, começa a se sentir insegura em relação a sua gravidez e temer pela saúde de seu bebê.
O momento é de tensão, pois incêndios na Amazônia provocam nuvens estranhas em São Paulo, onde mora, e Lúcia sente o peso não só da atmosfera quanto das relações humanas.
Quem interpreta Lúcia é a atriz também potiguar Badu Morais, em ótima performance. Entre uma ida e outra a uma igreja Neopentecostal, a personagem encontra conforto para dias tão incertos.
Jasmin, aliás, se inspirou num fenômeno que de fato ocorreu em São Paulo em agosto de 2019.
“Céu de Agosto” fala de algo que está no ar, de medos impalpáveis, que traduzem um estado de tensão e incertezas do Brasil de hoje.
“É um filme em que a personagem vai sentindo que tem algo no ar e ela vai ficando com medo… O medo vai tomando conta dela. Mas este é um filme anti-medo, o que foi um pouco o que aconteceu comigo… O filme foi inspirado num dia em que o céu ficou escuro, em 2019. A gente nãoo sabia na hora o que tinha acontecido. E a gente soube depois que era por causa dos incêndios na Amazônia. Parecia uma imagem concretizada do que a ente estava sentindo. De repente uma fuligem no céu escuro, uma fuligem se solidificando na nossa frente num Brasil em que estava todo mundo com medo, desesperado”, conta Jasmin.
“E eu andava com muito medo. E este céu escuro, de uma certa maneira, eu escrevi o roteiro um dia depois... Me moveu a produzir. No fundo, foi uma materialização meio terrível que me moveu. E a personagem também se move. Quando ela depara com algo tão maior que ela, que ela não tem controle, ela entra em movimento no filme fisicamente e imageticamente. Mas é um filme, claro, sobre estas coisas que estão no ar... tensões e medos que tem, claro, a ver com a política nos últimos anos do Brasil”, analisou Jasmin.
Sobre a recepção do filme, que no Brasil estreou na Mostra Tiradentes em janeiro, Jasmin tem sentido várias interpretações. “É um filme sobre o que está no ar... Quando veio a pandemia... eu verei agora estreando em Cannes como vai ser recebido. Em Tiradentes, tivemos várias respostas, vários significados. Mas vamos ver como o público internacional vai receber”, comenta a diretora.
Jasmin faz questão de pontuar que “Céu de Agosto” foi filmado antes da pandemia. “A gente filmou o filme antes. E depois da pandemia a gente não sabia como ele ia ser lido, ressignificado... Se ia passar, se ia ter festival online... a estreia internacional dele ser aqui em Cannes é um privilégio enorme... as pessoas reagindo ao vivo... Eu não entrava numa sala de cinema há 15 meses.. muita coisa junto acontecendo. É muito legal.”