Diretor de 'Maníaco do Parque' diz que filme não quer dar voz ao assassino: 'Respeito pelas vítimas'

Longa estrelado por Silvero Pereira e Giovanna Grigio já está disponível no streaming.

18 out 2024 - 05h01
Silvero Pereira interpreta Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque, em longa do Prime Video
Silvero Pereira interpreta Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque, em longa do Prime Video
Foto: Marcio Nunes/Divulgação

Desde a estreia dos filmes de "A Menina que Matou os Pais", sobre a história dos crimes cometidos por Suzane von Richthofen e os irmãos Cravinhos, uma espécie de "mina de ouro" do true crime se abriu no streaming. O sucesso de público de histórias baseadas em casos reais de assassinatos já é algo mais do que consolidado, e não são poucos os exemplos recentes de filmes e séries que exploram o tema. Mas será que não estamos chegando perto de um excesso em produções do gênero? Para o diretor Maurício Eça e a pesquisadora Thaís Nunes, tudo depende da abordagem. 

Os dois lançam nesta sexta-feira o filme "Maníaco do Parque", aguardada produção ficcional do Prime Video estrelada por Silvero Pereira e Giovanna Grigio, que interpretam respectivamente o assassino e uma jornalista que fica obcecada pelo caso. Em entrevista ao Terra, Eça e Nunes abrem o jogo sobre os desafios do filme e o que, para eles, o diferencia de outras obras semelhantes.

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"Fazer true crime não é nada fácil", declara Maurício, que também dirigiu os três filmes de Richthofen estrelados por Carla Diaz.

"A gente parte de escolhas que realmente não são simples, de ter muito respeito pela história e, principalmente, pelos envolvidos, inclusive as vítimas que não estão aqui entre nós. Em nenhum momento dessa história a gente quis que as cenas mais fortes fossem gráficas ou apelativas."

Maurício Eça, diretor, sobre escolhas narrativas de 'Maníaco do Parque'

De fato, apesar de o foco da história ser o circo midiático que se formou em torno da cobertura do Maníaco do Parque, o filme é discreto em cenas de ataques ou de corpos sendo descobertos no Parque. É claro, há uma ou outra nesse sentido para ilustrar o realismo da situação, mas Eça garante que a intenção foi sempre evitar o sensacionalismo.

"A gente via a necessidade de elas serem feitas, mas da maneira que foram, com muito cuidado. Não há nada tão explícito ou chocante porque, de fato, a gente se preocupou com os detalhes. Tivemos uma preparadora de elenco, a Larissa Bracher, e fizemos tudo com muita tranquilidade. É engraçado, as pessoas falam que o set deve ser superpesado, mas não é, porque estamos fazendo cinema e é tudo com muito respeito."

Silvero Pereira e Bruna Mascarenhas em cena de 'Maníaco do Parque'
Foto: Daniel Chiacos/Divulgação

Embora o filme, que já está disponível para streaming, leve o nome do personagem de Silvero Pereira, quem está no centro das atenções é, na verdade, a personagem de Giovanna Grigio. A atriz interpreta Elena, uma jovem jornalista (ou "foca", como diz o jargão) tentando se estabelecer em uma redação dominada por homens. Obstinada a assumir a cobertura do caso do Maníaco, a personagem que foi criada inteiramente para a ficção tem inspirações nas histórias verdadeiras da cobertura de 1998.

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"A nossa pesquisa começa três anos atrás, no Tribunal de Justiça de São Paulo, quando eu desarquivei o processo com meu time de pesquisadoras, todas mulheres", conta Thais Nunes -- entre as profissionais que trabalham ao seu lado estão, conforme creditadas, Victoria Mendonça, Isabela Twiaschor e Eduarda Smilari. "Fotografamos uma a uma as páginas dos 64 volumes do processo. A partir daí foi um trabalho mesmo de formiguinha, de tabular todas as informações e ir atrás das pessoas de forma cuidadosa."

"Desde o início, eu e todo o time entendemos o quanto essas pessoas foram maltratadas pela mídia. E eu não queria reproduzir o que foi feito em 1998."

Thaís Nunes, documentarista e pesquisadora, sobre nova perspectiva do caso Maníaco do Parque

"Então, tivemos muito cuidado para nos aproximarmos dessas pessoas e trazer um novo propósito para que essa história fosse contada", continua. "Eu costumo dizer que, no início, a gente achava que seria um projeto sobre como o assassino em série foi pego. E no fim das contas a verdade é que nós queremos discutir o porquê. Queremos saber por que esse assassino em série não foi pego antes."

Para Nunes, isso significa que o filme é uma possibilidade de reverter a narrativa vigente na época dos crimes de Francisco de Assis. "Que sociedade é essa que silenciava tanto as mulheres? Foi um terreno muito fértil para que o Francisco pudesse agir por tantos anos com tanta impunidade. Conversamos com mais de 50 pessoas e pudemos trazer para o roteirista, L.G. Bayão, informações sobre o caso e vivências minhas e de outras colegas que serviram como base para a construção da Elena."

O papel do jornalismo no caso Maníaco do Parque

Giovanna Grigio interpreta jornalista Helena em 'Maníaco do Parque'
Foto: Márcio Nunes/Divulgação

No longa, o extinto Notícias Populares é o veículo para o qual Elena trabalha. Embora não seja o único jornalístico que aparece em trechos da história, o jornal de cunho popular que circulou em São Paulo entre outubro de 1963 e janeiro de 2001, marcado por manchetes de cunho violento e apelativo que criaram grandes polêmicas na imprensa, acaba unificando o tom alarmista que a obra tenta criticar. 

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"O Notícias Populares de fato teve uma força enorme naquela época, com notícias sensacionalistas absurdas", contextualiza Eça. "Fizemos uma escolha que foi muito natural. A Elena talvez seja o elemento mais ficcional do projeto. Ela especificamente não existiu, mas existiram várias 'Elenas' e 'Helenos' e ela meio que representa todos eles."

"Se a gente tivesse feito o filme naquela época, ele teria sido feito de uma maneira provavelmente muito diferente. Fizemos uma escolha de dar voz a essas mulheres, sobreviventes e vítimas, sob o olhar de outra mulher que está investigando e também tem várias camadas."

Maurício Eça

O diretor ressalta que a transformação de Elena no filme é, para ele, um ponto muito importante do projeto. "No começo do filme ela ainda joga com as mesmas armas daqueles homens. E aí ela se transforma quando começa a entender o que tem de fato nessa histórias, quem são essas mulheres a quem ninguém dá voz. E ela se transforma também."

'Não é ele falando sobre ele'

Silvero Pereira interpreta Francisco de Assis em 'Maníaco do Parque'
Foto: Márcio Nunes/Divulgação

Além do filme, o Prime Video anunciou a série documental "Maníaco do Parque: A História Não Contada", que será lançada em 1 de novembro junto a um formato em audiossérie. Este projeto, que tem roteiro e direção de Thaís Nunes, tem áudios e materiais inéditos a partir das perspectivas das vítimas. 

"A principal diferença é que é a primeira vez que o Francisco não está no centro dos holofotes, no centro da narrativa. É muito curioso que a principal característica do transtorno gravíssimo de personalidade que ele possui é a capacidade dele de mentir e manipular situações. Ainda assim, ele foi o assassino que mais teve horas na televisão aberta para poder contar o que ele achava sobre si próprio."

Thais Nunes

"Então, pela primeira vez, desde 1998, desde que os crimes dele foram descobertos, ele não está no centro da narrativa. Não é ele falando sobre ele. Não é isso que importa para a gente", continua a pesquisadora e documentarista.

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"O que importa para a gente são as vidas que foram atravessadas por ele – e poder construí-lo, é claro, falar sobre a mente dele, mas não pela maneira como ele quer ser retratado, e sim pela maneira como especialistas, psiquiatras e psicólogos que o avaliaram o retratam à luz da ciência e à luz do que a gente sabe sobre o transtorno que ele possui."

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Fonte: Redação Entre Telas
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