O longa Aqui, dirigido pelo cineasta Robert Zemeckis, conta a história de uma casa e da família que ali viveu ao longo de décadas. A obra, que é filmada por um único ângulo e enquadramento — o do canto da moradia —, narra a vida das diversas gerações que passaram pela mesma residência. Baseado em um quadrinho homônimo escrito por Richard McGuire, o filme, estreia desta semana nos cinemas brasileiros, conta com Tom Hanks e Robin Wright no elenco — em uma reunião dos responsáveis por Forrest Gump - O Contador de Histórias.
Apesar de ter um diretor renomado e atores consagrados, Aqui vem sofrendo inúmeras críticas da indústria cinematográfica por conta do uso de inteligência artificial na produção do longa. Para retratar a passagem do tempo, Zemeckis optou por utilizar a tecnologia para rejuvenescer e envelhecer seus protagonistas e coadjuvantes. O rejuvenescimento digital não é novidade em Hollywood, mas a utilização de IA no processo é. E foi o uso da ferramenta que acabou se tornando o centro da polêmica.
A atriz Lisa Kudrow, por exemplo, criticou abertamente o uso da tecnologia. Ao podcast Armchair Expert, ela reclamou do que chamou de "endosso à IA". "Não é como se isso fosse arruinar tudo, mas o que vai restar? Esqueça atores consagrados, e os atores em ascensão? Os estúdios vão apenas licenciar e reciclar", criticou a atriz de Friends. "Que trabalho haverá para os seres humanos?".
As críticas de Kudrow foram as mais vocais, mas outros profissionais do mercado também demonstraram preocupação com o uso da tecnologia. Em um momento onde a indústria cinematográfica ainda está descobrindo e testando os limites da inteligência artificial, Aqui acabou pagando o preço por seu pioneirismo. O longa foi esnobado na temporada de premiações e, nos Estados Unidos, foi considerado um fracasso de bilheteria.
Em 2023, Tom Hanks chegou a criticar o uso da inteligência artificial no cinema. À época, a greve dos atores de Hollywood demandava maiores proteções dos estúdios contra o uso da ferramenta. "Qualquer pessoa pode recriar a si mesma em qualquer idade por meio da tecnologia de IA ou deepfake. Eu poderia ser atropelado por um ônibus amanhã e acabou, mas as performances continuariam indefinidamente", afirmou o ator em entrevista ao podcast do colega Adam Buxton.
"Não haverá nada para te dizer que não sou eu. E vai ter algum grau de realismo. Isso certamente é um desafio artístico, mas também é um desafio jurídico", completou. "Sem dúvida, as pessoas serão capazes de perceber [que é IA], mas a questão é: elas se importarão? Existem algumas pessoas que não vão se importar, que não farão essa distinção."
Qual é a vantagem de usar IA no cinema?
A opinião de Tom Hanks, no entanto, parece ter mudado. Em entrevista ao Radio Times em 2025, o ator defendeu a utilização da ferramenta e elogiou a velocidade da tecnologia. "Sabíamos que o supercomputador faria um trabalho de seis meses de pós-produção em um nanosegundo", afirmou. De acordo com ele, era possível visualizar os efeitos especiais momentos após a cena ser filmada.
Em entrevista à Variety, Kevin Baillie — o supervisor de efeitos visuais do longa — revelou que o uso da tecnologia facilita o processo de filmagem, removendo a necessidade de marcações nas faces dos atores e permitindo que eles foquem 100% de sua atenção na performance. "É um processo tão trabalhoso que, normalmente, você grava o filme sem a certeza de que o movimento corporal do ator de fato está sincronizado com a idade que ele deveria ter", afirmou Baillie, se referindo ao uso da tecnologia de rejuvenescimento sem o auxílio da IA.
Segundo o supervisor, o uso da ferramenta permite uma ideia mais precisa do que se está sendo filmado. "Não é uma ferramenta criativa, é uma ferramenta para profissionais criativos", afirmou. "Sempre há um artista supervisionando a tecnologia para garantir que ela está sendo fiel à performance dos atores."
Uma das principais críticas de boa parte da indústria em relação ao uso da IA é o sucateamento, ou até mesmo a abolição, de cargos importantes dentro de um set. Na visão de muitos especialistas, a IA seria utilizada para cortar custos e substituir o expertise de parte significativa da força de trabalho de Hollywood.
Robert Zemeckis, no entanto, entende que esse não precisa ser o caso. O cineasta, que já definiu o uso de IA como uma espécie de "maquiagem digital", afirmou, também à Variety, que a tecnologia é utilizada em conjunto com outros profissionais, não no lugar deles. "Não é como se algum departamento estivesse sendo eliminado. As pessoas do cabelo, da maquiagem e do digital — todas elas trabalham juntas", finalizou.