'Malu' expõe conflito de gerações e traumas familiares em filme doloroso e bonito

Estrelado por Yara de Novaes, Carol Duarte e Juliana Carneiro da Cunha, longa é emocionante estreia de Pedro Freire na direção de longas.

17 out 2024 - 10h12
'Malu': Yara de Novaes interpreta a atriz Malu Rocha em filme de Pedro Freire
'Malu': Yara de Novaes interpreta a atriz Malu Rocha em filme de Pedro Freire
Foto: Mostra SP/Divulgação

Um dos grandes atrativos da arte enquanto meio de expressão talvez seja também o que mais causa temor em um artista. Afinal, escancarar seus próprios medos e sua própria história é uma forma de tornar-se vulnerável ao que outros dizem e acreditam sobre você, quer você queira ou não. 

Embora não se coloque diretamente no meio da narrativa, é exatamente isso que o cineasta Pedro Freire faz em "Malu", sua estreia na direção de longas-metragens. Conscientemente ou não, esse mesmo olhar do artista para dentro de si, às vezes deslumbrado e às vezes cruel, parece ser algo que afetou profundamente sua dinâmica familiar, já que é a espinha dorsal de "Malu", filme que Pedro apresenta inspirado em sua mãe, a atriz Malu Rocha (1947-2013).

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Doloroso e ao mesmo tempo profundamente carinhoso com suas personagens, "Malu" é um livro aberto da história familiar do diretor, representado na personagem Joana (Carol Duarte) –que é, segundo o próprio cineasta, uma amálgama dele e de sua irmã, Isadora. Embora dote todos os personagens de muita complexidade e sentimentos divergentes, o longa jamais tira do foco sua real protagonista, a própria Malu, cuja personalidade é o ponto focal da história no sentido de como moldou quem estava ao redor. 

Encabeçado de maneira brilhante por Yara de Novaes neste papel certamente desafiador, o filme tem Carol Duarte e Juliana Carneiro da Cunha completando o trio central, vivendo três mulheres de três gerações de uma mesma família. Na trama, conhecemos Malu no anoitecer de seus dias de glória. Antes uma atriz de trajetória importante na TV e no teatro brasileiros, ela encontra-se desempregada, sobrevivendo das memórias de seu passado sob os holofotes enquanto divide uma casa no subúrbio com a mãe, Lili (Juliana), uma mulher adorável e preconceituosa com quem tem uma relação conturbada, e o amigo Tibira (Átila Bee). 

Tudo se transforma e a sensibilidade de Malu é aflorada com a chegada da filha Joana, que retorna de uma temporada em Paris carregada de referências para seu futuro na arte, algo que desperta na mãe todo tipo de sentimento ao se ver diante de um espelho indesejado.

'Malu' traz Yara de Novaes e Carol Duarte em relação complexa de mãe e filha
Foto: Mostra SP/Divulgação

Equilibrando essas três potências femininas cheias de aspirações e complexidades, "Malu" é um filme que não opta por saídas fáceis, e por isso é um drama belíssimo sobre disfunções familiares, traumas e memórias. A história funciona como uma gangorra emocional, cujo centro está definitivamente na entrega absurda de Yara de Novaes à personagem que interpreta com muito carinho e comprometimento. Mas, pendendo para os dois lados dessa mesma gangorra, a mãe, a filha e o amigo que estão sempre ao seu entorno completam essa teia familiar com seus próprios dilemas, sempre diametralmente opostos e complementares entre si. O resultado disso é uma mistura em que a alegria e a tristeza se alternam numa dança das cadeiras que até parece ensaiada, mas nunca forçada. 

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Como história de família construída sobre dores e traumas, "Malu" é um filme pesado e triste, mas muito sábio ao ser capaz de dosar a histeria sem cair na armadilha de deixar que o exagero tire a carga emocional genuína.

Quando chega no limiar de escorregar no excesso, o roteiro de Freire sempre consegue dar um passo para o lado e explorar as nuances dessa relação entre mãe, filha e avó tão doce e ressentida. Há um ciclo de violência em que essas três estão inseridas, que vai se apresentando no desenrolar da trama para contar ao espectador como certos traumas passam de uma geração para outra sem que ninguém saiba exatamente de onde vieram ou como chegaram ali. Mas esse ciclo de violência também é carregado de carinho e afeto, e a sabedoria master do filme é jamais subestimar a capacidade de sua audiência de compreender que ninguém ali é intrinsecamente bom ou ruim. 

No contexto de tantas relações familiares afetadas por divergências políticas, "Malu" demonstra um equilíbrio certeiro ao questionar o quanto cada um dos seus elementos afetam e interferem em nossas relações e em nossa capacidade de esquecer ou relembrar o que ficou para trás.  

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Fonte: Redação Entre Telas
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