A série dramática Euphoria, protagonizada por Zendaya na HBO, lançou uma reflexão a respeito de um conflito comum a todos nós: “Em algum momento, você tem que fazer uma escolha sobre quem você é e o que você quer”.
Olivier Rousteing quis ser o mais poderoso e rico estilista negro de todos os tempos. Conseguiu. Na virada dos 30 anos, ele foi encurralado pela outra questão: conhecer a verdadeira identidade.
O documentário Wonder Boy (Garoto Maravilha, em tradução livre; expressão usada para designar um homem jovem que conquista muito além do que se esperava dele) mostra o grande conflito do designer francês da Balmain.
Adotado ainda bebê por uma família branca de Bordeaux, Olivier quer descobrir quem são seus pais biológicos e entender por que foi “rejeitado” e entregue aos cuidados do Estado.
Entre desfiles e sessões de fotos, viagens pelo planeta e criações de novos looks, o estilista mantém contato com o departamento público que guarda as informações sobre sua origem. O processo para acessá-las é burocrático e doloroso.
Wonder Boy revela a solidão de Olivier. Depois de cada dia cheio de glamour e badalação, ele se vê sempre sozinho em casa, sem companhia para o jantar. Seu principal confidente é o motorista de origem árabe a quem pede conselhos.
O documentário dirigido pela parisiense Anissa Bonnefont desconstrói a imagem que se tem do virtuose que, aos 24 anos, assumiu a direção criativa de uma das casas de moda mais tradicionais da França.
Atrás do Rousteing chique e provocativo, vaidoso e bajulado, há um menino sensível, triste, solitário e cheio de inseguranças na vida privada. Ignorar quem realmente é o faz infeliz. “Não consigo me amar”, confessa.
Atenção: spoilers a seguir.
Na sequência mais dramática de Wonder Boy, Olivier convulsiona em choro ao descobrir que a mãe biológica, uma imigrante africana, tinha apenas 15 anos quando deu à luz. Tocante ver um filho começar a conhecer a mãe de quem ele não sabe o nome nem conhece o rosto.
Nunca faltou amor ao artista da moda em sua família adotiva. Seus avós protagonizam momentos fofos quando oferecem carinho ao neto. Contudo, ele sente falta, por exemplo, de ser parecido com alguém próximo e quer descobrir de qual etnia são seus traços faciais.
Como teorizou o psicanalista francês Jacques Lacan, uma pessoa sem informações exatas de sua origem pode, em explicação simplista, jamais se completar enquanto indivíduo nem se inserir completamente na sociedade por viver num conflitante jogo de ‘verdade e mentira’ a respeito de si mesma.
Lamentavelmente, o documentário não oferece o ápice esperado e termina quase em anticlímax. O telespectador fica à deriva. De certa forma, experimenta a mesma sensação do estilista: se sentir estranho na própria pele.
Curiosidade: alguns brasileiros famosos aparecem em cenas de badalação ao lado de Olivier Rousteing, como os jogadores Neymar e Daniel Alves, e as tops Alessandra Ambrósio e Adriana Lima.