Cláudia Raia contraiu o vírus da Aids. Gloria Pires tenta se matar após flagrar o marido e a filha mais velha na cama. Galã Mário Gomes é internado com cenoura entalada no ânus. Silvio Santos abandona a família para ficar com Sula Miranda. Marília Gabriela acoberta romance de seu filho com Gianecchini. Boneca da Xuxa é possuída por demônio e mata criança.
Caro leitor, o impacto que você deve ter sentido ao ler as frases acima dá a dimensão do poder destrutivo de uma mentira. Criadas e espalhadas décadas atrás, essas fake news produziram profundo sofrimento e compreensível revolta nos artistas envolvidos.
A maioria das vítimas precisou se expor publicamente para restabelecer a verdade. Dois exemplos dramáticos: Raia se viu obrigada a fazer um teste de HIV a fim de provar que não estava contaminada; Gloria e Orlando Morais, que criou Cléo como filha desde pequena, foram à TV pedir respeito à família.
Imagine o constrangimento vivido por esses artistas. O mesmo sentimento experimentado por Jéssica Canedo. Ela se desesperou com a divulgação em perfis de Instagram de falsos prints de romance com o influenciador Whindersson Nunes. Fragilizada, a jovem chegou a postar um desabafo e implorou pelo fim das mensagens de ódio.
Ignorada pela página de fofocas ‘Choquei’ (seu criador chegou a debochar do apelo), a jovem tirou a própria vida aos 22 anos. Agora engrossa a estatística que coloca o suicídio como a 3ª causa de morte entre jovens no Brasil. Mais uma vítima do gatilho emocional disparado pela postagem de uma falsidade.
Não há dúvida: fake news pode matar; e quem a espalha assume o risco de ter sangue nas mãos. Seja jornalista profissional, influenciador popular ou usuário anônimo da internet, a pessoa que dissemina o boato maldoso – consciente ou não do conteúdo falso, com ou sem interesse financeiro – deve ser responsabilizada.
A onda de indignação resultante da morte de Jéssica fez autoridades da esquerda à direita, como o ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida e o deputado federal Nikolas Ferreira, pedirem a regulamentação das redes sociais. Ministros do STF também a defendem.
Ainda que haja leis já aplicáveis, como a dos crimes contra a honra, que preveem punição a quem promover calúnia, difamação, injúria e exceção da verdade, a legislação precisa ser mais específica e rigorosa em relação a quem inventa e propaga fake news. A desonestidade não pode ficar impune no vale-tudo do universo digital.
Nenhuma possível condenação dos culpados ou indenização à família vai minimizar a pior dor do mundo imposta à mãe de Jéssica: enterrar um filho. Daqui a alguns dias, novas fake news ofuscarão essa tragédia. Quase ninguém vai continuar a falar da moça. Muitos perfis de fofocas continuarão a lucrar com farsas. O mundo – cada vez mais desumanizado – vai seguir doente e sem rumo. Triste verdade.