A maioria de nós passa a vida inteira a sonhar e morre sem conseguir realizar o sonho. Ou os sonhos. É a cruel realidade. Alguns poucos privilegiados, por conta de seu talento e do inexplicável fator sorte, chegam lá e sentem o prazer da conquista. Marília Mendonça esteve entre eles.
Sua morte abrupta e precoce ressalta o tamanho de suas vitórias em 26 anos de existência. Na idade em que quase todos estão apenas começando a construir algo, a cantora e compositora já havia se consolidado e tinha um império. Foi tudo rápido, intenso, meritório.
Não serve de consolo aos parentes, amigos e fãs, mas saber que Marília conseguiu tudo o que quis dá algum conforto emocional. Foi uma daquelas trajetórias de protagonista de novela: da infância humilde ao luxo, do anonimato ao estrelato, da sofrência romântica à experiência do amor incondicional ao se tornar mãe.
Marília realizou tudo o que quis, e talvez um pouco mais. Teve o que a maioria de nós jamais conseguirá. Nasceu, como se diz, com a estrela na testa. Predestinada a criar, emocionar, alegrar, inspirar. Generosa, compartilhou o sucesso com muitos parceiros e parceiras.
De longe, inúmeros artistas desconhecidos – que jamais vão pisar num grande palco nem terão fama e fortuna – se realizaram através dela. Viram-se espelhados na menina desacreditada transformada em rainha do gênero musical mais popular do Brasil.
Sua voz e as mensagens de suas letras preencheram vazios em corações e almas. O clichê do empoderamento feminino foi ressignificado: a cantora estimulou o ‘sexo frágil’ a fazer valer o seu valor. Era forte, destemida, dona de si. Cantou contra o machismo no mundo sertanejo, a violência doméstica e a misoginia na sociedade.
Quis o destino (ah, sempre complexo e caprichoso!) que ela morresse no Dia Nacional da Cultura. A data salienta seu legado pessoal e artístico. Cabe aqui um pensamento poético do escritor mineiro Guimarães Rosa: “O mundo é mágico. As pessoas não morrem, ficam encantadas”. Marília Mendonça virou encanto.