Quando ‘Vale Tudo’ estreou em maio de 1988 na Globo, Beatriz Segall tinha uma carreira consolidada. Mas foi aos 62 anos que ela interpretou sua personagem mais popular, considerada a mãe de todas as vilãs: Odete de Almeida Roitman.
O assassinato da empresária no capítulo exibido na véspera de Natal parou o Brasil. Nunca, antes e depois, houve um “quem matou?” tão impactante na teledramaturgia. Em comemoração a seus 60 anos, a emissora vai estrear um remake em 2025. Comenta-se que Fernanda Torres assumirá o papel icônico.
Nascida em família de classe média, Beatriz foi professora de francês antes de estudar teatro e literatura em Paris. Lá, conheceu Maurício Segall, filho do pintor Lasar Segall. Casaram-se e tiveram três filhos. Juntos, arrendaram o Theatro São Pedro, na capital paulista.
Na ditadura, o intelectual com militância contra o regime autoritário foi preso, torturado e condenado. Beatriz se viu sozinha com os meninos pequenos e sob constante opressão. Passou meses de dificuldades até o marido ser solto.
No início dos anos 1980, o casal apoiou o Partido dos Trabalhadores liderado pelo então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva. Na década seguinte, separam-se amigavelmente. A atriz se decepcionou com a legenda de esquerda.
Em 2002, ela gravou depoimento para o programa do horário eleitoral de José Serra, candidato à Presidência pelo PSDB. Reagiu em solidariedade a Regina Duarte quando a colega foi hostilizada por declarar “sentir medo” com a possível chegada do PT ao poder.
“Também estou com medo de não poder dizer que estou com medo, de ser ameaçada de processo por discordar”, disse Beatriz, segundo a ‘Folha de S. Paulo’. “Quero uma democracia sem pressões, em que eu possa dizer o que eu quiser.” Lula venceu a eleição.
Anos antes, em entrevista a Bruna Lombardi no programa ‘Gente de Expressão’, a artista manifestou revolta com quem pedia nova intervenção militar no país.
“Fico horrorizada quando vejo até carta no jornal com pessoas dizendo que é preciso um regime forte, um regime militar. As pessoas não têm memória?”, questionou.
“Não se podia abrir a boca, você corria perigo de vida. Muita gente morreu neste país. Todo mundo vivia amedrontado... Como alguém pode pensar (em pedir a volta da ditadura)? Para mim, é antes de mais nada uma demonstração enorme de ignorância.”
Beatriz Segall morreu em setembro de 2018, aos 92 anos, em consequência de problemas respiratórios. Naquele momento, ‘Vale Tudo’ era reprisada no canal Viva. Jamais haverá outra Odete Roitman tão fenomenal. A atriz ocupa lugar especial na memória de quem é apaixonado por televisão.