Uma mulher tem o direito de transar com quem deseja? Ela pode se vestir da maneira que quiser? Merece a liberdade de dizer tudo o que pensa?
Se você respondeu “sim” pelo menos uma vez, precisa reconhecer a contribuição de Madonna para a libertação feminina no Século XX.
Desde que surgiu na mídia, no início da década de 1980, a cantora dá a cara a tapa para defender os direitos básicos das mulheres.
O direito de não ser desrespeitada por homem, não ceder a assédio, não sentir culpa nas diferentes formas de prazer sexual, não ser dependente financeiramente, não se submeter a algo apenas para agradar e ser aceita...
O show de Copacabana dividiu o país entre fãs e haters da artista, num reflexo gritante do desmembramento político-ideológico que sufoca a população há alguns anos.
Na internet, os críticos se disseram horrorizados com a “putaria” no palco, ou melhor, os beijos na boca, as simulações de masturbação e sexo, o contexto bissexual. O erotismo e a autonomia do desejo ainda chocam. Estamos mesmo em 2024?
Por que alguém que detesta Madonna – e o que ela representa na sociedade – se deu o trabalho de assistir à transmissão na Globo (a emissora mais pró-LGBTQIAP+) e depois foi protestar nas redes sociais?
Não era mais digno ter assistido a um filme, lido um romance, ouvido cantos gregorianos? Quem ligou a TV para ver a apresentação da rainha do pop sabia muito bem o que seria encenado. Voyeurismo?
A hostilidade contra a cantora se explica por machismo, misoginia, etarismo, reacionarismo, etarismo e também por frustração, desconhecimento histórico e falta de empatia (especialmente de mulher para mulher).
Ninguém é obrigado a gostar de Madonna, suas músicas e as coreografias cheias de lascívia. Vivemos em um país com liberdade de pensamento e expressão. Um direito fundamental que a própria artista defende.
Mas a honestidade intelectual requer aceitá-la como uma personagem imprescindível na longa e interminável guerra das mulheres contra um mundo sempre hostil a elas.
Sem Madonna e outros ícones libertários, como as nossas corajosas Dercy Gonçalves e Elke Maravilha, a vida das mulheres contemporâneas – que já é difícil – seria ainda mais censurada, desvalorizada e vulnerabilizada.