Um dos personagens mais sensíveis e poéticos da teledramaturgia brasileira é Tião Galinha, o catador de caranguejos que vai trabalhar numa fazenda de cacau e sonha ter uma pequena propriedade para garantir a sobrevivência da mulher e dos filhos.
Com fala mansa, ele exala poesia e consciência social. Guarda certa inocência infantil a ponto de acreditar num diabo engarrafado. Ao mesmo tempo, cultiva as dores emocionais dos desvalidos. “Se eu também sou filho de Deus, por que não posso ter meu pedacim de terra?”, questiona.
No remake de ‘Renascer’, o papel será de Irandhir Santos, um ator visceral assim como Osmar Prado, intérprete na versão original de 1993. Acarinhado pelos telespectadores, o primeiro Tião deixou a trama antes do fim.
“Durante a novela tive um embate com um executivo da Rede Globo e eu pedi pra sair, pra antecipar a morte do Tião, com ele no auge”, contou Osmar no programa ‘Grandes Atores’ do Canal Viva em 2015.
O ator, hoje com 76 anos, é conhecido nos bastidores da TV pela firmeza de suas convicções e a doação irrestrita ao trabalho. Para defender o que pensa, não hesita bater de frente com colegas e profissionais de esferas superiores.
A escolha do autor Benedito Ruy Barbosa para o desfecho de Tião Galinha desagradou a Osmar: o suicídio numa cela de delegacia.
“Falei para o Luiz Fernando Carvalho (diretor da novela) que a cena não estava completa. Como que esse personagem, com tanta força, vai se matar por nada? Disse que queria uma bofetada na minha cara, bater em uma pessoa digna.”
Assim foi feito. Tião apanhou, injustamente. Em nome da honra, preferiu a morte à humilhação. Saiu da novela de maneira dramática e mais pobre do que nunca. Qualquer semelhança com a vida da maioria do povo não terá sido coincidência.
O personagem representava o brasileiro simples e sonhador, trabalhador e invisibilizado, oprimido e desrespeitado. Os tiões anônimos não têm voz nem poder, mas se orgulham de sua dignidade.
O desentendimento atrás das câmeras deixou Osmar Prado longe da Globo por cinco anos. A atuação mais recente foi como o Velho do Rio no remake de ‘Pantanal’ em 2022.
Em sua galeria de tipos marcantes estão também o motorista mulherengo Tabaco de ‘Roda de Fogo’ (1986), o místico Sérgio Cabeleira de ‘Pedra Sobre Pedra’ (1992), o alcoólatra Lobato de ‘O Clone’ (2001) e o rabugento Coronel Epaminondas de ‘Meu Pedacinho de Chão’ (2014).