A âncora de telejornal que atirou na própria cabeça ao vivo

Na Netflix, filme baseado em fato real mostra como o sensacionalismo por audiência pode gerar o caos diante das câmeras e nos bastidores

28 fev 2020 - 11h53

Até que ponto o jornalismo policial feito na TV deve saciar a sede de violência e sangue do público? Talvez a pergunta deva ser outra: o quanto as emissoras são responsáveis pelo terrorismo emocional da população ao exagerar na cobertura de crimes?

Retrato de uma história real, o filme Christine, do diretor Antonio Campos (filho do apresentador do Manhattan Connection, da GloboNews, Lucas Mendes, e da produtora de cinema americana Rose Ganguzza), aborda essa questão ao mostrar como o jornalismo policialesco afeta também a saúde mental dos profissionais de TV.

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No filme, o momento no qual Christine Chubbuck (Rebecca Hall) faz o ato desesperado aos olhos dos telespectadores
No filme, o momento no qual Christine Chubbuck (Rebecca Hall) faz o ato desesperado aos olhos dos telespectadores
Foto: Reprodução

No longa disponível na Netflix, a equipe de uma emissora do sul dos Estados Unidos está sob intensa pressão para dar mais audiência. O chefe do canal exige que os repórteres exibam casos de violência e bizarrice para atrair telespectadores.

Com problemas pessoais, a âncora Christine Chubbuck (Rebecca Hall) vê sua vida virar um tormento. Ela, que buscava o jornalismo de qualidade e tinha ambição de ser uma apresentadora respeitada, sucumbe à tensão.

Durante o telejornal, avisa ao público que algo inédito será exibido ao vivo e em cores: então saca um revólver calibre 38 e atira contra a própria cabeça. O sangue jorra no cenário. Em casa, diante da TV, a mãe de Christine se assusta com o barulho do disparo.

Incrédulos, os colegas de estúdio demoram alguns segundos para entender a situação. Depois de mostrar a apresentadora curvada na bancada, a transmissão é interrompida.

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Socorrida, Christine Chubbuck morreu 14 horas depois da tentativa de suicídio. Tinha 29 anos quando o fato ocorreu, em julho de 1974, no canal WXLT de Sarasota, na Flórida.

A verdadeira Christine Chubbuck no estúdio da WXLT: crise pessoal agravada pela pressão por Ibope
Foto: Reprodução

Entre as folhas do roteiro do telejornal daquela manhã trágica encontraram um texto no qual a jornalista explicou que sua morte era uma crítica ao jornalismo sensacionalista. Soube-se depois que Christine lutava conta depressão severa.

No Brasil de 2020, os excessos dos programas policiais voltaram a ser discutidos após uma mãe ser informada ao vivo do assassinato da filha enquanto era entrevistada no Cidade Alerta, da RecordTV. Tomada pelo desespero, a mulher desmaiou diante da câmera. Um show deprimente.

Esse gênero de atração é alimentado pela onda devastadora de crimes no País e também pelo interesse sádico do público. O problema começa quando o era para ser jornalismo vira exploração da desgraça alheia, o que era para constituir informação se torna tétrico.

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Cabe a emissoras, jornalistas, apresentadores, anunciantes e telespectadores refletir a respeito dessa prática nociva na TV. Metaforicamente, uma arma carregada está apontada para a cabeça de todos os envolvidos e, ao mesmo tempo, todos estão com o dedo no gatilho.

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