“Poder é infligir dor e humilhação. Poder é estraçalhar a mente humana e depois juntar outra vez os pedaços, dando-lhes a forma que você quiser”, escreveu George Orwell no livro ‘1984’. O romance distópico serviu de inspiração para o holandês John de Mol criar o formato do ‘Big Brother’. Na 21ª edição brasileira, o que se viu na primeira semana de competição foi exatamente guerra por poder, dor emocional e vexame.
Lucas representa a obsessão por controlar os demais, assim como o ‘Grande Irmão’ da obra literária, que a tudo vê e a todos tenta dominar. O ator se mostra tão equivocado no jogo que sua família fez um comunicado no qual sinaliza com a possibilidade de o jovem estar sob o efeito de “ansiedade e depressão”. Até um leigo em psicologia e psiquiatra consegue notar alteração comportamental preocupante.
Paralelamente à pandemia de covid-19, o planeta vive uma onda assustadora de transtornos mentais. A maioria das pessoas sofre calada, sem pedir ajuda, sem diagnóstico nem tratamento e medicação. Assistir à tortura emocional que Lucas impõe a si mesmo e aos demais competidores suscita uma luz amarela: a produção do programa não vai agir? O sofrimento individual e a apreensão coletiva serão tratados como parte do entretenimento ao telespectador?
A advogada Juliette é outra participante visivelmente alterada. Ela disse fazer uso de remédio contra ansiedade. Suas atitudes impulsivas na casa geraram prejulgamento e ironia. Quem minimizou o problema — Fiuk e Karol Conká, entre eles — ajuda a piorar a situação e o estigma ao invés de oferecer solidariedade. A pressão habitual infligida aos ocupantes da casa do ‘BBB’ tem sido aumentada devido aos gestos e palavras de intolerância de alguns competidores. No fim, dominados e dominantes se mostram igualmente infelizes.
Há tudo no ‘Big Brother Brasil 21’, menos alegria. A edição iniciada com gente eufórica, alguns até forçadamente animados, hoje está sob permanente estresse. Ninguém lá demonstra realmente se divertir com a experiência, ao contrário do que se viu em edições anteriores, quando havia muitos momentos de algazarra em meio ao caos da disputa pela sobrevivência diante das câmeras. Aqui do lado de fora, há quem esteja festejando esse início soturno e angustiante. Vibrar com o tormento alheio é uma espécie de escapismo da própria realidade. Mais ‘1984’, impossível.