Quer que uma coisa aconteça? Basta proibi-la. Cedo ou tarde, a ordem será desrespeitada — e o proibidor, desmoralizado. Foi o que ocorreu com a Globo no ‘Big Brother Brasil 21’. A determinação aos participantes de não fazer comentários políticos foi previsivelmente descumprida. Ponto para a necessária liberdade de expressão.
Em um Brasil chafurdado na política, com polarização ideológica e radicalização de discurso, seria impossível um reality show passar incólume por esse período tenso da história. Afinal, o programa se pretende um reflexo da sociedade, com diversidade de tipos, origens e pensamentos. O posicionamento político é indissociável do indivíduo. Mesmo quem diz ser avesso à política ou não militante já está a marcar posição.
Apesar da ordem da Globo e dos cortes na edição, vários comentários com teor político foram repercutidos nas redes sociais e na imprensa. O presidente Jair Bolsonaro e os ex-presidentes Lula e Dilma foram citados. A casa do ‘BBB21’ reproduz a divisão entre direita e esquerda vista aqui fora. Diferentemente do clima bélico entre oponentes na internet, os competidores souberam conviver com as diferenças políticas até agora.
Uma manifestação recente ocorreu na festa de sábado (3), durante show da cantora Ludmilla. A música ‘Ela Não’ incentivou Gil, João e Juliette a gritar “Ele não”, em explícita referência ao movimento #EleNão contra o então candidato Jair Bolsonaro — e cujo ‘grito de guerra’ ainda é usado por muitos críticos do presidente.
A simpatia declarada pelo chefe do Executivo fez Sarah ser ‘cancelada’ por parte do público. Na primeira menção a ele, a sister revelou ter deixado de segui-lo nas redes sociais para evitar julgamento. Em outra ocasião, quando alguém questionou se algum presidente teria sofrido impeachment naquele período em que estavam confinados, a consultora de marketing se manifestou. “Mas de outro País, não do nosso. Gosto dele.”
Em conversa com Carla e Arthur, Pocah mostrou sentir o contrário. Eles afirmaram acreditar no poder das palavras e começaram a repetir algumas como se fossem mantras. “Final, final, final”, “pódio, pódio, pódio”, disseram. Até que a funkeira se animou: “Impeachment, impeachment, impeachment”. Carla riu. “Adorei”, disse Arthur, batendo palmas. Antes disso, a internet havia vibrado ao descobrir que o instrutor de crossfit segue Lula em uma rede social, e não é seguidor de Bolsonaro.
A determinação da Globo para não se falar de política foi novamente ignorada quando Gil e Juliette elogiaram a postura de Dilma Rousseff no processo de impeachment, em 2016. Ela foi humilhada, escorraçada!”, observou a maquiadora. “Eu não sei como ela aguentava, porque eu tinha chorado.” O economista opinou: “Ela tinha peito, viu?” Antes disso, o brother já havia sinalizado apoio à ex-presidente. “Amava aquela mulher”, declarou em papo anterior.
Sempre que os participantes começam a discutir política, a edição do programa age rápido para mudar a câmera e desviar a atenção do telespectador. Quase todas as citações a políticos captadas no pay-per-view ou no Multishow não foram exibidas na versão exibida na Globo. Mas a internet se encarrega de capturar as falas e repercutir. O tiro da emissora saiu pela culatra: quanto mais tenta despolitizar o ‘Big Brother Brasil’, mas politizado o reality fica.