Falsa notícia de assédio ressalta o perigo do prejulgamento

Repórter da Globo esclareceu não ter sido vítima de abuso por parte de técnico de som cruelmente condenado pelo atroz tribunal da internet

20 nov 2018 - 15h01

Imagine você, leitora, ser informada de que foi vítima de assédio sexual por parte de um colega de trabalho, em público, sem nem ter percebido tal violência.

A jornalista Fabiola Andrade viveu momentos de extrema tensão até o esclarecimento do caso
A jornalista Fabiola Andrade viveu momentos de extrema tensão até o esclarecimento do caso
Foto: Instagram / Reprodução

Imagine você, leitor, se ver acusado injustamente de ter cometido o referido abuso com base na interpretação equivocada de uma imagem gravada a muitos metros de distância.

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As duas situações acima descritas são igualmente angustiantes, desesperadoras até. E não se trata de mera especulação. Aconteceu.

As vítimas do mal entendido foram a repórter Fabiola Andrade, da Globo e SporTV, e um operador de som, sem identificação revelada, da equipe técnica que a acompanhava na cobertura do jogo Corinthians e Vasco, na Arena Corinthians, sábado passado.

O ângulo de uma imagem registrada por um torcedor deu a impressão de que o rapaz passara a mão nas nádegas da jornalista. A gravação viralizou nas redes sociais e no WhatsApp.

O que se seguiu? O julgamento sumário do funcionário anônimo do Grupo Globo. Ele foi imediatamente rotulado de assediador sexual, antes de contar sua versão do fato. Afinal, uma imagem vale mil palavras, não é?

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Surgiram nas timelines uma enxurrada de notas de repúdio de clubes, apresentadores, comentaristas esportivos, entidades de defesa da mulher, e também ataques verbais de gente aparentemente perita em análise audiovisual. Vale lembrar que equívocos semelhantes já provocaram linchamento de inocentes no Brasil.

Vários portais deram a manchete com destaque na home, em indisfarçável tática caça-clique. Muitos canais do YouTube se apressaram em postar o vídeo para garantir visualizações. ‘Oh lelê / Oh lalá / Espere um pouquinho / Vamos faturar.’ Notícia ruim rende, mesmo quando não é notícia.

Assustada e confusa, Fabiola Andrade informou que a Globo apurava o caso. A jornalista foi sensata ao não prejulgar o acusado.

Na tarde de segunda-feira, a repórter divulgou um comunicado em seu perfil no Instagram: “A respeito do vídeo que está circulando nas redes sociais desde ontem eu queria dizer que vi outros ângulos do mesmo momento do jogo e conversei com o meu colega que trabalha comigo há cinco anos. Ele me procurou várias vezes hoje. Pra mim não aconteceu assédio ou abuso. Ele estava manuseando o cabo de áudio que fica preso à minha roupa durante a transmissão, situação comum em dias de jogos”.

A emissora também se manifestou oficialmente para negar o episódio de assédio após avaliação criteriosa de imagens de outros ângulos da mesma cena. Foi um engano. De boa ou má-fé? Eis a questão.

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Imagine, leitor e leitora, o pânico sentido pelo tal técnico de som desde o momento em que passou a ser apontado como criminoso sexual até o restabelecimento da verdade; e a tortura vivida pela jornalista, sem saber se tinha ou não entrado para a cruel estatística de mulheres assediadas no trabalho, no ônibus, na rua, em todo lugar.

Testemunhamos, todos nós, mais um lamentável episódio de prejulgamento, temperado com doses generosas de oportunismo e sadismo.

Apontar o dedo para o outro, mesmo sem a certeza da culpabilidade alheia, parece gerar um prazer patológico menor apenas do que o estrago emocional na vítima da injustiça.

Fake news como essa, a do falso assédio sexual, alimentam o nefando tribunal da internet e deixam a pessoa de bem com o temor de ser o próximo alvo da implacável maledicência coletiva.

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