'Flor de pessoa': vilãs do diabo eliminaram os companheiros

Algumas novelas apresentaram ‘mulheres de família’ envolvidas em crimes tão chocantes quanto os da vida real

28 ago 2020 - 12h04

“Tomadas pelo ódio, as mulheres são mais perigosas do que os homens”, escreveu o filósofo alemão Friedrich Nietzsche. Outro pensador, o grego Plutarco, afirmou que “nada é mais terrível” do que a maldade feminina. Será verdade ou se trata de ‘achismo’ com teor machista? Uma espiada na teledramaturgia brasileira das últimas décadas mostra vilãs com instinto homicida que fazem jus a essa visão fatídica dos dois intelectuais. Elas fizeram atrocidades que assustariam até o capeta. 

Carminha, Beatriz, Flora, Laurinha e Magnólia: sob a imagem de mulheres de família se escondia uma alma diabólica
Carminha, Beatriz, Flora, Laurinha e Magnólia: sob a imagem de mulheres de família se escondia uma alma diabólica
Foto: Sala de TV

“Eu nunca gostei de regras”, dizia Beatriz (Gloria Pires) em Babilônia (2015). A ricaça indomável eliminou várias pessoas. A começar pelo primeiro marido, que não apareceu na novela, foi apenas citado. Muitos anos (e amantes) depois, ela se casou com o magnata Otávio (Herson Capri) e forjou um assalto para eliminá-lo a fim de colocar a mão na herança. Despudorada, a personagem sofreu com mudanças bruscas na novela para tentar reverter a baixa audiência. Tinha tudo para ser mais uma grande vilã de Gilberto Braga, porém não seduziu os noveleiros. 

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Em A Lei do Amor (2016), Magnólia Leitão (Vera Holtz) queria transmitir a imagem de boa mãe, esposa perfeita e cristã exemplar. Era, na verdade, cínica e inescrupulosa. Foi amante do próprio genro por longo tempo e armou um atentado contra o marido, Fausto (Tarcísio Meira), e o grande amor da vida dele. Tratava mal a filha problemática e agia nos bastidores da política de sua cidade a fim de impor interesses escusos. O marido permaneceu anos em coma. Ao acordar, desmascarou a víbora e morreu de infarto. No desfecho, a acuada Magnólia se jogou na frente de um trem. O folhetim criado por Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari abordou a hipocrisia no seio da tradicional família brasileira. Tal contestação do conservadorismo incomodou parte do público. O tempo mostrou que foi uma trama realista e relevante.

Nos primeiros capítulos de A Favorita (2008), Flora (Patrícia Pillar) parecia um anjo injustiçado. A maior parte dos telespectadores acreditou que ela havia sido presa injustamente sob a acusação de ter matado a tiros o amante, Marcelo (Flavio Tolezani), marido de sua ex-companheira de dupla sertaneja Donatela (Claudia Raia). A virada na trama revelou que ela era, na verdade, o diabo em pessoa. Foi mesmo a autora do crime. Dezenas de capítulos depois, Flora voltou a atacar: matou outro amante, Dodi (Murílo Benício), para defender Donatela, por quem mantinha assustadora obsessão. O autor João Emanuel Carneiro criou uma vilã debochada que caiu no gosto do povo. A sequência na qual Flora cantou o clássico caipira Beijinho Doce virou febre na internet.

Carminha (Adriana Esteves) fingiu ser ‘santa, recatada e do lar’ para seduzir Tufão (Murilo Benício) em Avenida Brasil (2012). Era parte do plano executado com a ajuda do amante Max (Marcello Novaes). Ela não só se casou com o ex-jogador cheio da grana como levou o cúmplice para dentro de casa, na condição de marido da irmã de Tufão. Quando Max se tornou uma ameaça à dondoca do subúrbio, Carminha tentou afundá-lo em um barco. Falhou. Tempos depois, o matou com golpes de uma pá. Acabou presa e, no final, se mostrou redimida. Virou o quê? Uma política populista. Final sarcástico com crítica social escrito também por João Emanuel Carneiro.

O brasileiro ama uma bandidona de folhetim. Prova disso é a sobrevida de Nazaré Tedesco (Renata Sorrah), de Senhora do Destino (2004). No arremate dramático, a raposa felpuda se atirou de uma ponte, porém continua vivíssima na memória das pessoas graças aos memes com sua imagem. No decorrer da novela, a hilária maléfica criada pelo autor Aguinaldo Silva assassinou vários adversários. O primeiro deles, o próprio marido, Luís Carlos (Tarcísio Meira), que era um obstáculo a seus planos criminosos. Como esquecer a cena em que ela o faz rolar escada abaixo? Aliás, esse método para eliminar oponentes virou marca registrada da golpista que se dizia “mulher de respeito”. 

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Outra personagem igualmente demoníaca foi Laurinha Figueroa (Gloria Menezes), de Rainha da Sucata (1990). A socialite mantinha casamento de conveniência com o empresário falido Betinho (Paulo Gracindo), enquanto nutria paixão proibida pelo enteado Edu (Tony Ramos). Para se livrar do marido idoso, ela o convencia a comer doces, mesmo ele sendo diabético. A saúde do ex-ricaço se deteriorou pouco a pouco. Decidida a acelerar o fim, Laurinha trocou uma ampola de insulina por glicose. Betinho teve uma crise e não resistiu. Mas a viúva peçonhenta não conseguiu seduzir Edu. Desiludida, ela se jogou do alto de um prédio na Avenida Paulista para culpar a rival, Maria do Carmo (Regina Duarte), por sua morte. Foi uma das melhores personagens criadas pelo novelista Silvio de Abreu.

Antigamente se dizia que um acontecimento absurdo era “coisa de novela”. A crônica policial mostra que, às vezes, a realidade é tão brutal (ou mais) do que a ficção. Por trás do tal aviso “qualquer semelhança com pessoas ou fatos será mera coincidência” pode existir um retrato fiel do lado sórdido da sociedade, onde a maldade se impõe como protagonista absoluta. 

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