As emissoras de TV não conseguem desviar de obviedades recorrentes ao noticiar a morte da ex-primeira dama Marisa Letícia.
A imprensa em geral falhou ao não se aprofundar no perfil da mulher de Lula. Há uma incógnita no ar.
A desculpa dos jornalistas será sempre a mesma: ela era calada, avessa a entrevistas, seus pensamentos não tinham relevância.
E assim deixaram escapar uma personagem crucial da história recente do Brasil.
Ainda que discreta e despolitizada, a esposa de um presidente possui inegável influência nos bastidores do poder.
Basta recordar a profusão de manchetes e fatos cruciais gerados por primeiras-damas como Ruth Cardoso, Rosane Collor e Thereza Goulart.
Nenhum repórter deve esperar que o personagem entregue seu diário íntimo para que possa escrever a respeito dele. Na história do jornalismo, grandes perfis foram feitos sem uma única palavra do biografado.
Para isso é fundamental correr atrás da notícia, e não se servir apenas de releases e informações copiadas de redes sociais – ou de vazamento criminoso de informações confidenciais.
“Sem pisar na rua o jornalista não entenderá nada”, resume o aclamado Gay Talese, pai do jornalismo literário e autor de memoráveis perfis de famosos e anônimos, vários deles publicados no The New York Times.
Nos últimos anos, Dona Marisa Letícia esteve no epicentro do noticiário político. Contudo, jamais mereceu um olhar diligente da imprensa. Era apenas a esposa de Lula, ponto.
Pelas décadas anteriores à Presidência, por ter passado oito anos ao lado do marido no Palácio da Alvorada e, recentemente, sido transformada em coprotagonista de denúncias midiáticas, ela certamente guardava um arquivo íntimo de lembranças, sentimentos, opiniões, contradições.
Aparentemente nenhum figurão do telejornalismo se deu o trabalho de perguntar, apurar, analisar, e assim contribuiu com a superficialidade com que a TV trata alguns personagens curiosos da vida brasileira.