O papel da imprensa é informar a verdade dos fatos, por mais chocantes que sejam. Mas, para o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência, Luiz Eduardo Ramos, os veículos de comunicação devem ajudar a acalmar a população assustada com a pandemia de covid-19. "A mídia tem um papel fundamental na percepção do povo, para que as pessoas se sintam melhor", disse.
Na entrevista coletiva com alguns ministros, no fim da tarde de quarta-feira (22), Ramos reclamou do excesso de pessimismo no noticiário da TV. "Nós temos observado uma cobertura maciça dos fatos negativos", afirmou. "Temos pessoas muitos suscetíveis a essas notícias. No jornal da manhã é caixão, é corpo. Na hora do almoço é caixão novamente, é corpo. No jornal da noite é caixão, é corpo e número de mortes."
O general carioca, um dos poucos conselheiros do presidente Jair Bolsonaro, sugeriu que os jornalistas passem a divulgar mais vezes o "número de curados e o trabalho maravilhoso dos profissionais da saúde". Na avaliação dele, essa abordagem suavizada da crise do novo coronavírus no Brasil deixaria o povo "um pouco mais sereno".
Horas depois, a maioria dos principais canais da TV aberta ignorou o apelo do ministro. O Jornal Nacional, da Globo, exibiu o enterro de várias vítimas de covid-19 em vala comum em um cemitério de Manaus. A mesma cena dramática fez parte do Jornal da Band, que mostrou ainda câmaras frigoríficas usadas para armazenar corpos na capital do Amazonas.
O RedeTV News também apresentou a situação chocante dos enterros coletivos em Manaus. No SBT Brasil, o destaque foi o atendimento médico a um paciente inerte em uma cama de UTI de Nova York. Depois, imagens de um cortejo fúnebre, porém, o enfoque da matéria tinha viés positivo: a queda no número de mortes e internações no estado americano mais afetado pelo novo coronavírus. Em outra matéria, o telejornal colocou no ar o translado de um caixão em um cemitério de Belém do Pará.
O Jornal da Record se diferenciou por não gerar as tais imagens negativas, associadas à morte, criticadas pelo general Ramos. Mais analítico, o Jornal da Cultura também não incluiu cenas de corpos e caixões em sua edição de ontem.