(Atenção: este texto contém spoiler.)
Um dos momentos mais tensos retratados no filme Hebe, em cartaz, é quando um censor ameaça tirar a apresentadora do ar caso insista nas participações em seu programa da entusiasmada (e lasciva) sexóloga russa Olga del Volga.
Tratava-se de personagem criada pelo ator argentino Patricio Bisso. Ele morreu na segunda-feira (14), aos 62 anos, em consequência de parada cardiorrespiratória, em Buenos Aires.
A TV da década de 1980 viveu anos de censura rígida e, mesmo depois da redemocratização, houve por um tempo monitoramento ideológico do que era exibido nas grandes emissoras.
Olga del Volga era chamada de ‘bicha’ e ‘travesti’ por quem não compreendia a personagem e sua intenção de brincar com a sexualidade e as fronteiras entre o masculino e o feminino.
No longa, Hebe digladia com seu então diretor na Band para garantir a presença da convidada polêmica diante das câmeras.
A grande estrela da TV vence a queda de braço em sua guerra particular pela liberdade de expressão e, nas palavras dela, em “defesa dos excluídos”.
Olga Del Volga foi uma espécie de precursora de Mamma Bruschetta, interpretada por Luiz Henrique e vista até pouco tempo no Fofocalizando (SBT), e a Tia, papel de Guilherme Uzeda no Mulheres (Gazeta).
Antes mesmo de fazer sucesso ao lado de Hebe, a personagem já tinha conquistado muitos fãs ao integrar o elenco da novela Um Sonho a Mais, de Daniel Más, produzida na Globo em 1985.
A atuação e a coragem de Patricio Bisso ajudaram a tornar a televisão brasileira mais ousada, divertida e inclusiva.
Se hoje há liberdade para mostrar as diversidades sexual e de pensamento nos canais, é porque décadas atrás existiram artistas destemidos que deram a cara a tapa. A maioria deles, infelizmente, foi esquecida.
Além de ator, Patricio Bisso era jornalista, ilustrador, figurinista e cenógrafo. Deixa a mãe, de 90 anos, com quem morava na capital argentina.
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