Em contraponto à banalização da guerra da Síria, que já não tem espaço relevante na mídia internacional nem suscita a mesma comoção pública, o primeiro capítulo de Órfãos da Terra, nova produção das 18h30 da Globo, ressaltou a tragédia humanitária do conflito que se arrasta desde 2011.
A família da protagonista Laila (Julia Dalavia) começa sua trajetória dramatúrgica na festa de aniversário do caçula, na Síria, quando é alvo de um ataque a bomba.
Por consequência, enfrenta a escassez de recursos, toma a difícil decisão de abandonar o lugar de origem na tentativa de escapar da morte e caminha por semanas até um campo de refugiados no vizinho Líbano – encenação das peregrinações reais mostradas tantas vezes nos telejornais.
As autoras Thelma Guedes e Duca Rachid foram hábeis em mostrar que os refugiados não são uma ameaça ao estilo de vida da civilização ocidental, como pensam alguns governantes, e sim vítimas de uma situação degradante. Gente que imigra com um único objetivo: sobreviver.
Hoje são os sírios. Antes, os haitianos. Muitas décadas atrás, italianos, japoneses, judeus... Cada povo teve sua própria razão para partir rumo ao Brasil, a terra que um dia já foi símbolo de tolerância e convivência pacífica entre os diferentes.
No núcleo árabe-paulistano, chefiado pela imigrante síria Rania (Eliane Giardini), a discussão na estreia de Órfãos da Terra girou em torno do feminismo.
Enquanto Camila (Anaju Dorigon) demonstra desprezo pelo discurso de empoderamento das mulheres, sua sobrinha Cibele (Guilhermina Libanio) exibe os seios em um protesto contra o assédio sexual e a objetificação do corpo feminino. Gorda, ela faz da própria silhueta um ato político contra o machismo, o sexismo e o padrão de beleza perfeita.
O casal principal da novela, Laila e Jamil (Renato Góes), também luta contra conceitos arcaicos. Entre as quais, a submissão autodestrutiva do empregado diante do empregador (no caso, o sheik-vilão Aziz, interpretado com destreza por Herson Capri, que obriga o rapaz a assumir uma morte cometida por ele).
Na última cena, os dois jovens se conhecem a partir de uma intensa troca de olhares. O mais eficiente dos clichês marcou o final de uma estreia empolgante, com cenários grandiosos, bons efeitos especiais, interpretações corretas, drama convincente e um frescor bem-vindo, após longa sequência de novelas com ambientação convencional.
Órfãos da Terra começou bem: entregou o que prometia nas chamadas ao longo das últimas semanas: entretenimento bem embalado a quem busca um tempo de escapismo no início da noite.