O Neymar que disse “não sou preto” hoje é líder antirracismo

Jogador se agiganta ao usar fama e poder para denunciar e combater o racismo no futebol e na sociedade

9 dez 2020 - 09h55

O Neymar de 2010, com 18 anos, ficaria surpreso ao ver a evolução do Neymar de 2020, aos 28. O garotão alienado que ignorava o racismo estrutural se tornou um homem consciente dessa anomalia social.

Neymar foi da rejeição da própria negritude à liderança na guerra contra o racismo
Neymar foi da rejeição da própria negritude à liderança na guerra contra o racismo
Foto: Fotomontagem: Blog Sala de TV

Na terça-feira (8), ele comandou a mobilização em Paris dos jogadores do PSG e do Istanbul Basaksehir contra o quarto árbitro flagrado chamando de “preto” um membro africano da comissão técnica do time turco.

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“Não vamos jogar”, decretou o brasileiro, voz cada vez mais poderosa e atuante contra o racismo no futebol. A partida foi suspensa e o ato coletivo dos atletas repercutiu nos quatro cantos do planeta.

Esse Neymar de hoje, inteirado de sua ascendência e do papel comunitário que se espera dele, em nada lembra o rapaz imaturo de uma década atrás, época na qual a luta antirracista tinha menor adesão dos ícones do esporte.

Naquela ocasião, em uma entrevista ao ‘Estadão’, o jovem ídolo do Santos demonstrou desconhecimento a respeito da própria identidade racial e da importância da luta contra o preconceito.

Questionado se já havia sido vítima de racismo, ele deu uma resposta incongruente. “Nunca. Nem dentro e nem fora de campo. Até porque eu não sou preto, né?”

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No Brasil, onde prevalece o colorismo, a pessoa de ascendência negra com pele mais clara, como Neymar, passa por ‘parda’, ‘morena’ ou outro eufemismo qualquer. No exterior não existe essa interpretação.

O atacante tomou um choque de realidade em relação à própria negritude em 2014, quando se tornou alvo de manifestações racistas em jogos do campeonato espanhol.

Foi quando percebeu que toda pessoa vista como não-branca, independentemente da autodefinição, se torna alvo potencial de discriminação.

Ao sentir o preconceito na pele, Neymar aderiu à campanha ‘Somos Todos Macacos’, criada após Daniel Alves comer uma banana atirada contra ele em campo com a intenção de insultá-lo.

Sob a ótica brasileira, o famoso lateral-direito também não seria considerado negro por não ser retinto e ter olhos claros. Fora daqui, tal subjetividade na classificação racial não existe.

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A partir de recorrentes episódios racistas no seu entorno privilegiado, atingindo a ele próprio e a amigos, Neymar desenvolveu consciência sobre a questão.

Passou a apoiar manifestações antirracistas e se uniu a colegas do futebol para reagir aos frequentes atos de discriminação nos estádios. A ira entre torcidas infla o racismo internalizado de muitos torcedores.

Em setembro, o astro do PSG foi expulso de campo após reagir com um tapa a uma provocação odiosa do zagueiro espanhol Álvaro González, do Olympique de Marseille.

“Macaco filho da puta”, disse o oponente, de acordo com leitura labial feita por especialistas. O caso teve repercussão planetária. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos divulgou nota em solidariedade a Neymar.

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O brasileiro já havia sofrido ofensivas racistas. Uma em abril de 2015, quando torcedores do Espanyol fizeram sons de macaco toda vez em que ele tocava a bola. Oito meses depois, recebeu insultos verbais proferidos por pagantes do mesmo clube catalão.

Tais ocorrências baseadas em preconceito e ódio certamente geraram no jogador dores emocionais e maior conexão com a realidade. Sua postura midiática contra o preconceito se faz imprescindível nessa luta por respeito e igualdade. O menino Ney cresceu e amadureceu.

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