Não há novela mais interessante do que a protagonizada pela família real britânica. De tempos em tempos, emerge uma trama capaz de estremecer os alicerces da dinastia Windsor e hipnotizar os súditos e o resto do planeta. Foi assim com Diana Spencer, e a história se repete com Harry, o novo enfant terrible da corte de Elizabeth II.
O príncipe ruivo que um dia foi visto como patinho feio sempre à sombra do irmão galã William agora assume o protagonismo da própria vida. Como a imprensa mundial divulgou, ele quer deixar de ser um membro sênior da realeza para ter mais liberdade.
Em outras palavras, pretende deixar de ser refém da tradição, se livrar dos compromissos burocráticos da nobreza e viver com sua família bem longe dos palácios e castelos. Harry deseja ter ao lado da mulher, Meghan Markle, e do filho deles, Archie, uma vida comum, ou o mais próximo disso.
É o mesmo que desejava Diana, mãe e inspiradora de Harry. Ela entrou para o clã de Vossa Majestade como uma moça virginal e facilmente manipulável. Tornou-se, ao longo do tempo, a mulher que ousou desafiar os poderes da soberana e explicitar os podres em torno da rainha. Vinte e três anos depois de sua morte precoce, Diana ainda é a pessoa mais famosa e bem avaliada a ter feito parte daquela monarquia de quase 1.000 anos.
A atitude de Harry, vista como mera rebeldia por alguns e gesto de libertação por outros, parece vingança da princesa massacrada pelos dogmas do reino de sua sogra insensível. Parte da mídia e do público acredita que o príncipe está sendo mal influenciado por Meghan, rotulada como vilã desde que se recusou a interpretar o papel da plebeia subserviente.
Pelo andar da carruagem, Harry não é o bobo da corte que se imagina. Tem personalidade própria e indomável, como a da mãe. Quer viver a vida real, e não um falso conto de fadas. Ele já demonstrava interesse por autonomia na adolescência.
Jovem, exigiu ser tratado como qualquer outro soldado durante missão contra os talibãs no Afeganistão. Insistiu para servir no Iraque, mas não recebeu autorização do comando por conta do alto risco de morte. Frustrado pelo que considerou proteção excessiva, deixou o Exército.
A exemplo de Diana, Harry sinaliza a vontade de ser menos controlado, vigiado e subestimado. Sexto na linha de sucessão ao trono, ele sabe que a chance de um dia ser rei é mínima. Por isso, não vê motivo para se submeter docilmente ao sistema. Quer tomar as rédeas de sua existência e impedir que o filho cresça na mesma gaiola de ouro onde se sentiu aprisionado na maioria parte da vida.
"Gosto de ser um espírito livre. Alguns não gostam disso, mas esse é o meu jeito", declarou Diana certa vez. "Não sigo as regras estabelecidas. Lidero com o coração, não com a cabeça", disse em outra ocasião.
Pelo visto, o apreço pela independência de pensar e agir foi a grande herança imaterial transmitida pela princesa a seu caçula. Para horror dos conservadores e tradicionalistas, Harry se revela um nobre revolucionário como era a mãe dele.
Há quem diga que a infeliz Diana está sendo finalmente vingada por alguém sangue de seu sangue. Crendice à parte, começa a ser inscrito novo e surpreendente capítulo na novelesca monarquia britânica. Prevê-se fortes emoções. Ao povo resta pedir que, agora mais do que nunca, "God save the queen".