Do luto à luta. A família do ator Pedro Lima decidiu usar a visibilidade na mídia para alertar as pessoas a respeito da importância dos cuidados com a saúde mental. O artista cometeu suicídio aos 49 anos, em 20 de junho deste ano. Ele lutava discretamente contra a depressão havia alguns anos. Deixou a mulher e cinco filhos, além de muitos amigos e numerosos fãs. Era um dos atores mais populares da teledramaturgia de Portugal.
A viúva, Anna Westerlund, quebrou o silêncio mantido nos últimos tempos para refletir a respeito da atitude extrema do marido e das dores emocionais que afetam milhões de pessoas. “Sinto que o momento que vivemos torna urgente que se fale de saúde mental e de depressão sem tabus. De um dia para o outro passamos a contar contaminados e óbitos, ficamos sem liberdade como a conhecíamos, a viver uma insegurança em relação ao futuro e presos numa paranoia do presente. Pensar que isto não terá repercussões na saúde mental das pessoas é sermos muito ingênuos”, escreveu em uma rede social, fazendo referência à pandemia de covid-19.
No mesmo texto, a artista plástica sugere que os efeitos colaterais de uma medicação teriam contribuído para o agravamento do estado emocional do ator. “O Pedro estava a ser seguido por um psicólogo e um psiquiatra em consultas on-line. Tinha uma vontade enorme de se tratar. Há medicamentos que têm como possível efeito secundário o suicídio. Se o diz, é porque em algumas pessoas causará esse efeito. Isto é um fato, não é uma especulação.”
Diante de afirmação alarmante, o blog ouviu o Prof. Dr. Mário Eduardo Costa Pereira, professor titular de Psicopatologia Clínica da Aix-Marseille Université, da França, livre-docente no Departamento de Psiquiatria da FCM-UNICAMP e professor da Casa do Saber, de São Paulo, a respeito da suposição apresentada por Anna Westerlund.
“O suicídio é um fenômeno muito complexo. Essa determinação linear do suicídio não é uma boa maneira de colocar o problema”, afirma o especialista. “Não se deve levantar a hipótese de que a pessoa se matou porque tomou determinado remédio.”
O médico explica a possível ação de certas sustâncias. “Há medicamentos cujo uso pode aumentar o risco (de suicídio) em algumas populações. Em especial tipos de antidepressivo em adolescentes e adultos jovens. Fazem aumentar a taxa (de risco). Mas dizer que são a causa do suicídio é excessivo.”
Na avaliação do psiquiatra, alguns perfis de pacientes precisam de atenção extra ao fazer uso de medicação controlada. “Pessoas com risco de suicídio, depressão grave, abuso de drogas, quadros psicóticos importantes, idosos morando sozinhos ou com doença grave devem fazer o uso de medicação com acompanhamento de um profissional.”
Na mensagem em tom de desabafo, a viúva de Pedro Lima disse que “todos sem exceção estamos suscetíveis de um momento para o outro de ultrapassarmos o nosso limite, porque ninguém sabe qual é o seu gatilho”. De acordo com amigos, o ator estava excessivamente preocupado com a queda na renda e as dívidas por conta da pandemia. Minutos antes de morrer, enviou mensagens ao celular de pessoas próximas para pedir que não deixassem faltar o essencial aos filhos dele.
A cada ano, cerca de 800 mil pessoas cometem suicídio no planeta, uma a cada 40 segundos. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), o Brasil está em oitavo entre os Países com maior número de suicídios, e a taxa subiu 7% no último levantamento. Aqui, cerca de 75% dos suicídios são cometidos por homens.
“A depressão é a principal causa de incapacidade em todo o mundo. Para quem está do lado de fora por vezes não consegue perceber, para quem sente por dentro por vezes é difícil de explicar. O que falta é falar sobre isto. Sem tabus. Não estás sozinho”, finalizou Anna Westerlund. O filho mais velho de Pedro Lima, o estudante João Francisco, de 22 anos, acaba de se unir à Active Minds, associação internacional de educação em saúde mental para jovens adultos, com o objetivo de incentivar a prevenção ao suicídio.