Nos últimos dias, Chico Pinheiro usou o Twitter, onde tem quase 500 mil seguidores, para criticar a ação de garimpeiros na Amazônia, defender os povos indígenas, contestar o risco à democracia e aos direitos humanos no governo de Jair Bolsonaro, reprovar o uso de dinheiro público nas motociatas do presidente e ainda afirmar “Xô, golpistas. Ditadura nunca mais”.
Essa é apenas uma amostra de seu ativismo on-line que desagradava a cúpula do jornalismo da Globo. O veterano âncora jamais deixou de se manifestar como cidadão. Logo após a prisão de Lula, em 2018, vazou um áudio no qual Chico defendeu o ex-presidente. “Realizaram o fetiche. O fetiche deles era Lula na cadeia”, dizia um trecho. “A direita está louca. Os coxinhas estão perdidos.”
A gravação gerou um comunicado do diretor de jornalismo da emissora, Ali Kamel, a todos do departamento. “Não se pode expressar essas preferências publicamente nas redes sociais, mesmo aquelas voltadas para grupos de supostos amigos”, alertou. “...é impossível que os espectadores acreditem que tais preferências não contaminam o próprio trabalho jornalístico, que deve ser correto e isento.”
Dona do Grupo Globo, a família Marinho nunca teve simpatia pela esquerda. Roberto Marinho era um homem de pensamento conservador, amigo de generais do regime militar e apoiou Fernando Collor contra Lula na eleição de 1989. A Globo sempre foi vista como mais à direita no espectro político.
Chico Pinheiro era um estranho no ninho. Na redação da emissora há muitos jornalistas de esquerda, mas nenhum com a visibilidade televisiva e o engajamento dele na internet. A insistência em ignorar a ordem de imparcialidade e fazer posts diários sobre política eram interpretadas como uma afronta. O gaúcho de alma mineira nunca teve medo de possíveis consequências.
A saída da Globo foi de “comum acordo”, segundo uma nota oficial. Coincidentemente, acontece no início da cobertura da eleição presidencial, com Lula e Bolsonaro, sempre citados pelo âncora tuiteiro, em iminente confronto histórico. Aos 68 anos, Chico ainda tem muito a oferecer ao jornalismo. “É vida que segue”, diria. Tomara que o velho repórter não desista do ofício que faz tão bem.