Chamada pela esquerda de ‘Globo golpista’ nos últimos anos, a emissora da família Marinho tinha o desafio de recuperar a imagem de imparcialidade de seu jornalismo nessa eleição.
No geral, seus telejornais exibiram uma cobertura coerente ao longo da campanha. Mas alguns acontecimentos suscitaram repercussão negativa.
As sabatinas com Jair Bolsonaro e Fernando Haddad na bancada do ‘Jornal Nacional’ fizeram os âncoras William Bonner e Renata Vasconcellos serem contestados pelo tom inquisidor.
Na ocasião, os dois presidenciáveis torpedearam a emissora. Bolsonaro usou a diferença salarial entre Bonner e Renata para tentar justificar a razão de muitos homens ganharem mais do que mulheres.
Vociferou contra os “bilhões” que o canal receberia de verba estatal (informação depois contestada pelo Grupo Globo) e voltou a citar o apoio do fundador da emissora, Roberto Marinho (1904-2003), ao regime militar. O candidato do PSL soube usar a Globo contra a Globo.
Ao ficar diante das câmeras do ‘JN’, Haddad soltou uma frase bombástica que ecoou na imprensa e nas redes sociais: “A Globo condena por antecipação”.
Questionado pelos apresentadores a respeito de vários petistas investigados em inquéritos sobre corrupção, ele devolveu: “A Globo também é investigada”. E insistiu: “Vocês não tratariam os problemas da Rede Globo como tratam os problemas do PT”. O candidato se referia a cobranças de impostos feitas ao canal pela Receita Federal.
Outra vez, questões internas da emissora foram usadas em momento de grande visibilidade para contestar sua isenção jornalística e o hipotético prejuízo que teria gerado aos cofres do governo.
Mais grave foi a suspeita de omissão provocada pelo pouco espaço dado nos telejornais para abordar a acusação de uso criminoso de mensagens de WhatsApp por apoiadores de Jair Bolsonaro.
A emissora passou a cobrir o caso com a devida atenção somente dois dias depois, quando o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) reconheceu a gravidade da denúncia e iniciou uma investigação. Críticos de Bolsonaro afirmaram que a Globo poupou o militar.
O grande golpe sofrido pela mais poderosa rede de TV do País foi o cancelamento do debate presidencial do segundo turno, considerado o mais importante evento televisivo da campanha.
O ‘duelo’ entre os dois presidenciáveis na Globo, às vésperas da abertura das urnas, sempre rendeu prestígio à emissora. Construiu-se a ideia de que esse debate seria capaz de influenciar milhões de eleitores e interferir no resultado eleitoral.
O vácuo aberto pela ausência do programa, uma tradição na televisão brasileira desde a disputa eleitoral de 1989 entre Collor e Lula, fez a Globo perder relevante poder de influência e ser ofuscada pela força imensurável das redes sociais e do WhatsApp.
Líder absolto em audiência, o canal é desprezado tanto por petistas-lulistas-haddadistas como pelos bolsonaristas. Seja qual for o presidente eleito, a relação poderá ser tensa.
Bolsonaro, que se declara perseguido pela TV, foi explícito. Disse mais de uma vez que pretende reduzir o investimento de publicidade do governo federal nos intervalos da emissora (atualmente, são cerca de 500 milhões por ano). A empresa dos Marinhos minimiza o impacto de tal medida. Argumenta que a propaganda oficial corresponde a menos de 4% de suas receitas publicitárias.
O PT de Haddad defende a regulação da mídia para evitar, entre outras coisas, que uma empresa de comunicação seja dona de vários veículos de diferentes plataformas. É o caso do Grupo Globo, proprietário da TV Globo, jornais, revistas, rádios, gravadora e portais de notícias.
Com Bolsonaro ou Haddad na presidência da República, a Globo terá desafios a enfrentar – e provavelmente vai continuar sob ataque de quem se sente injustiçado por seu jornalismo.