Em entrevista a Pedro Martins na ‘Folha’, Manuela Dias contou um pouco do remake de ‘Vale Tudo’, no ar em março às 21h. Ela foi a escolhida da Globo para reescrever a novela clássica de 1988, famosa pelo mistério ‘Quem matou Odete Roitman?’
O que muitos temiam se confirmou: a adaptadora descaracterizou a personagem vivida por Beatriz Segall. Sua marca registrada era falar mal dos brasileiros e do país, verbalizando o que a elite branca pensava – e continua a pensar – a respeito da classe média, dos pobres, dos pretos etc.
“Odete seguirá sendo uma vilã, mas sua vilania está muito ligada ao momento. ‘Vale Tudo’ foi a novela da volta da democracia, e naquele momento falar mal do Brasil, ou poder falar mal, era resistência, era revolucionário, era novo”, diz Manuela.
“Hoje não é mais. A gente está saturado disso. O novo é encontrar maneiras de transformação. Odete não aponta caminhos, mas será diferente.”
A autora avisa que o novo texto da vilã terá “críticas construtivas”. Parece que, infelizmente, o politicamente correto vai matar a obra original, despudorada e corajosa – e com humor deliciosamente depreciativo que fez Odete ser tão adorada quanto reprovada.
As falas da personagem – criadas por Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères – deixavam explícito o racismo, a aporofobia, o classicismo e o machismo. Problemas ainda atuais. Suas incorreções seriam um prato cheio para o debate social, especialmente nas redes sociais.
Em um Brasil radicalizado e com crescimento da extrema direita, Odete Roitman serviria para explicitar na maior vitrine disponível, a televisão, o pensamento e o comportamento que precisam ser combatidos. Uma vilã pasteurizada não terá muita utilidade. Nem graça.