A informação de que a Globo não vai renovar o contrato da autora Lícia Manzo gerou zero surpresa. De certa maneira, ela estava sob risco na emissora desde o mau desempenho de audiência de sua primeira novela das 21h, ‘Um Lugar ao Sol’, exibida entre novembro de 2021 e março de 2022.
O projeto seguinte, ‘O País de Alice’, para a faixa das 18h30, foi cancelado quando estava em pré-produção. Segundo fontes, a avaliação interna constatou ser uma trama sofisticada demais – focada em música erudita e na redescoberta da identidade cultural – e com baixo potencial de resultado no Ibope.
Lícia é conhecida pelas cenas mais longas e com diálogos dramáticos, ao estilo das novelas antigas. Seu talento para retratar com delicadeza e assertividade as dores humanas ficou registrado nas novelas ‘A Vida da Gente’ e ‘Sete Vidas’, seus trabalhos mais interessantes.
Outra autora viveu destino semelhante na emissora. Ângela Chaves foi dispensada no fim de 2021, após escrever o remake de ‘Éramos Seis’ para as 6 da tarde. Foi sua primeira novela como autora principal após 17 anos no canal. Não teve audiência ruim, mas frustrou quem cultivou elevada expectativa.
Em 2024, ela ressurgiu com ‘Pedaço de Mim’ na Netflix, um dos maiores sucessos da plataforma de streaming no Brasil. Falou-se mais desta série com apenas 17 capítulos do que da maioria das novelas da Globo. Ângela precisou sair do canal mais famoso do país para ser merecidamente reconhecida pelos críticos e o público.
Em 2022, Maria Adelaide Amaral foi dispensada da Globo após três décadas escrevendo novelas e séries. Ela estava sem emplacar uma obra desde ‘A Lei do Amor’, sua primeira novela às 9 da noite, com audiência insatisfatória e repercussão negativa.
Ofereceu outras ideias à direção, como uma série (depois encomendada como novela) sobre o compositor Carlos Gomes. Nada foi adiante. Argumentos: a produção seria excessivamente cara ou o roteiro não era popular. Deixou o canal com vários êxitos no currículo, a exemplo de ‘A Muralha’, ‘A Casa das Sete Mulheres’ e ‘Sangue Bom’.
A demissão destas autoras – ressalte-se que as mulheres ainda são minoria entre os escritores da teledramaturgia nacional – destaca a pressão negativa da audiência sobre o talento. Nem sempre o que é bom atrai tantos telespectadores. E quem preza pela qualidade de seu ofício ao invés de pensar apenas nos pontos de audiência pode pagar um preço caro.