Sentindo-se um fantasma por não viver a própria identidade e abatido pela distância da mulher que ama, Beto Falcão (Emílio Dantas) passa boa parte do tempo no quarto, deitado. Às vezes chora, dolorosamente.
O protagonista de Segundo Sol sofre de depressão. Não é um caso apenas ficcional. Milhões de homens padecem em razão do mesmo transtorno. A maioria sofre em silêncio por vergonha de pedir ajuda.
A sociedade exige uma postura insensível do macho ocidental: não pode demonstrar fragilidade, carência ou medo. Essa imposição cruel produz milhares de suicídios de homens deprimidos que não buscaram tratamento.
O número de mortes relacionadas à deterioração da saúde mental cresce assustadoramente. A depressão é a principal causa de suicídio no mundo. A cada ano, cerca de 11 mil brasileiros se matam – destes, 79% são homens. Os dados são do Ministério da Saúde.
Na novela das 21h da Globo, Beto foi obrigado a viver uma existência mentirosa. Dado como morto num acidente aéreo, assumiu a identidade de Miguel, um falso primo do ‘finado’ cantor de axé transformado em ídolo póstumo na Bahia.
O dinheiro procedente do golpe proporciona conforto, mas não ameniza o drama existencial do rapaz. Ele se sente um morto-vivo e passa a hostilizar quem faz elogios a ele próprio – ou melhor, ao saudoso Beto Falcão. São quase 20 anos de farsa. Quem suportaria abrir mão de ser quem se é por tanto tempo?
A outra fonte de tortura emocional é Luzia/Ariella. Beto está mais apaixonado do que nunca. Depois de um caloroso reencontro com a ex-marisqueira, perdeu novamente contato com ela. Esse desencontro consome sua alma.
Poucos folhetins mostraram um herói sofrendo tanto por uma mulher. O músico de Segundo Sol está, aos poucos, morrendo de amor. Sua família acha que a cura está na reconciliação com a vilã Karola (Deborah Secco).
Somente o filho dele, Valentim (Danilo Mesquita), igualmente sensível e também apaixonado por uma mulher de história complexa (a garota de programa Rosa/Letícia Colin), consegue compreender o sofrimento de Beto. Os dois são os ‘mocinhos’ mais martirizados na teledramaturgia recente da Globo.
O autor João Emanuel Carneiro usa Beto Falcão para conscientizar os telespectadores contra o tabu de que homem não pode sofrer. As causas de aflição são variadas: pressão no trabalho, insatisfação no relacionamento, crise financeira, impotência sexual e debilidade pelo envelhecimento estão entre as mais comuns.
A depressão não tem cura, mas possui tratamentos medicamentoso e psicoterapêutico capazes de restaurar a qualidade de vida do paciente, seja homem ou mulher.
Beto Falcão terá final feliz. Mas a vida não é uma novela. Por isso é tão importante discutir a depressão até mesmo em obras de entretenimento, feitas teoricamente apenas para afastar por algum tempo as pessoas de suas dores cotidianas.