Pedro Bial ouve mais do que fala. Esta é, indiscutivelmente, a melhor característica de seu talk show nos fins de noite da Globo.
Há outro diferencial valioso: quando se propõe a falar, o jornalista sabe bem o que diz. Não é refém de perguntas óbvias preparadas pela produção. Demonstra dedicação à pauta e interesse genuíno pelo entrevistado.
Isso ficou evidente no bate-papo com Rita Lee na madrugada desta quinta-feira (4). Bial sabia detalhes das entrelinhas da autobiografia lançada pela roqueira e recordou encontros que teve com ela em shows, antes de se tornar repórter e, depois, já consolidado na TV.
E Rita, aos 69 anos, deu um inebriante show de carisma e sinceridade. Falou abertamente sobre violência sexual na infância, dependência de drogas, a experiência como ‘muambeira de LSD’, sonhos eróticos, repressão na ditadura, libertação feminina e outros temas evitados pela maioria dos artistas quando estão diante das câmeras. Até surpreendeu Bial ao questioná-lo a respeito do ‘Big Brother Brasil’.
No palco, figurinos icônicos da carreira da cantora conduziram a plateia a uma viagem no tempo. O jornalista Guilherme Samora, editor da revista ‘Quem’ e espécie de filho postiço de Rita Lee, ajudou a rememorar momentos históricos, como um especial exibido na Globo, em setembro de 1980, no qual ela cantou um de seus maiores sucessos, ‘Lança Perfume’.
A exibição de imagens de arquivo, aproveitando o rico acervo da emissora, deu um tom nostálgico ao programa e, ao mesmo tempo, fez-se merecida homenagem à rainha do rock nacional, presenciada por alguns familiares e amigos no estúdio.
Com a tranquilidade de quem está seguro de sua erudição, sem sentir necessidade de expô-la a cada comentário, Pedro Bial conduziu a entrevista com leveza e, generoso, inúmeras vezes levantou a bola para a entrevistada cortar. Ele acerta ao não competir com o convidado pelos holofotes – comportamento raríssimo entre apresentadores do gênero.
A TV aberta está carente de mais conversas com Bial. Aqueles 45 minutos precisam ser multiplicados para suprir a demanda de telespectadores cansados de tanta superficialidade e cabotinismo na programação.
Rita Lee, sem autocensura:
- Atitude roqueira de hoje em dia: “cuidar da horta”.
- Vida sem drogas: “tô ‘limpa’ desde que minha neta nasceu, onze anos. Tô achando louco ser careta”.
- País passado a limpo: “o Brasil tá tão Gotham City. De vez em quando prendem um Coringa, uma Mulher-Gato. Haja Batman!”
- Dedicação aos animais: “eu entendo o Divino pelos bichos”.
- Desafiando a lógica: “não acredito em avião. Em disco voador, eu acredito”.
- Aposentadoria dos shows: “não dá uma veinha no palco... (Foram) cinquenta anos pulando, tá bom”.